CAPA
EDITORIAL (pág. 2)
Bráulio Luna Filho - Presidente do Cremesp
ENTREVISTA (pág. 3)
Eder Gatti
SAÚDE PÚBLICA (pág.4)
Os números da dengue em SP
ISS (pág. 5)
Regularização de débitos
SAÚDE SUPLEMENTAR (pág. 6)
Honorários médicos
MAIS MÉDICOS
Saúde de qualidade
SAÚDE +10 (pág. 8)
Movimento médico
FINANCIAMENTO (pág. 9)
SUS
INSTITUIÇÕES (pág. 10)
Reabilitação
AGENDA (pág. 11)
Planejamento
EU, MÉDICO (pág. 12)
Medicina = Superação
JOVENS MÉDICOS (pág. 13)
Mais médicos
BIOÉTICA 1 (pág. 14)
Ética Médica
BIOÉTICA 2 (pág. 15)
Vício e Vulnerabilidade
ESCOLAS MÉDICAS (pág. 16)
Violência estudantil
GALERIA DE FOTOS
EU, MÉDICO (pág. 12)
Medicina = Superação
Brasilândia tem o médico mais idoso do PSF
Com competência e gentileza, Duarte Malva Vicente, de 90 anos, atua ativamente em UBS da periferia da Capital
Malva: "Bons médicos olham para o paciente"
Médico mais idoso a atuar no Programa Saúde da Família (PSF), Duarte Malva, aos 90 anos, atende na UBS Vila Terezinha, na Brasilândia, periferia da zona norte da Capital. Com mais de sessenta anos dedicados à profissão, o médico já foi inclusive homenageado na Câmara Municipal de São Paulo.
Malva se formou em 1953, na Escola Paulista de Medicina/Unifesp. Conta que, para seguir a profissão, se dividia entre atividades que o ajudassem a enfrentar a dificuldade financeira. Fez apostilas, dissecção de cadáveres e foi monitor de diferentes disciplinas. “No terceiro ano, um médico do hospital do Mandaqui estava reunindo estudantes e me chamou. Iria ganhar algum dinheiro e precisava. Mas eu não era o único, todos nós, estudantes, tínhamos nossas dificuldades”, exemplifica. O hospital estava se preparando para a inauguração quando a Santa Casa de Santos, que cuidava de doentes com tuberculose na época, desabou. E, então, ele foi contratado com urgência para recuperar o atendimento no litoral, ao lado de outros colegas de faculdade. Acabou trabalhando lá por 48 anos.
Carreira
O médico, que ficou órfão aos dez anos, começou, com essa idade, a engraxar sapatos e carregar itens na feira para manter-se. Aos 17, convocado para a 2ª Guerra Mundial, viajou com seu batalhão pelo litoral brasileiro. Três anos depois, deu baixa. Passados outros três anos, ingressou no curso de Medicina.
“Fui monitor de Anatomia, Cirurgia, Técnica Cirúrgica e de todos os serviços comuns no Hospital São Paulo. Na época, usava o bonde como transporte coletivo e o chão ainda era de terra. Trabalhei lá até conseguir estágio no Hospital das Clínicas, em Obstetrícia”, conta Malva. Em 1º de fevereiro de 1954 – ele faz questão de lembrar a data exata –, o médico abriu um consultório próprio no bairro de Imirim. Logo passou em um concurso para cirurgião, especializando-se em Cirurgia de Tórax.
“Do ponto de vista médico, eu tive uma carreira mais voltada ao atendimento popular do que para o ambiente acadêmico. Apesar disso, tenho um prêmio de reconhecimento da Academia Nacional de Medicina porque participei dos primeiros transplantes de fígado. Mas essa não era uma dedicação absoluta, era parcial, porque eu trabalhava em vários lugares”, comenta Malva. Viúvo, ele mora com a filha, a médica Magali Vicente Proença, diretora do Conjunto Hospitalar do Mandaqui.
Com competência e gentileza, Duarte Malva Vicente, de 90 anos,
atua ativamente em UBS da periferia da Capital
Transformações
Mesmo com os muitos anos de Medicina, Malva vê com naturalidade as mudanças na profissão. Todavia, analisa que o uso do computador pode interferir no que para ele há de mais importante no ofício: a atenção dedicada ao paciente. “Você tem que atender o doente, ver a cor dos olhos, do cabelo, olhar de frente, de costas. O computador é muito bom mas, por ser rápido, facilita que você se perca na velocidade dele”, declara.
Para Malva, a tecnologia pode auxiliar no atendimento, porém não se pode resumir a Medicina a ela, nem diminuir a importância do profissional de Saúde. “O exame não é a Medicina em si. É preciso observar quem acompanha o paciente, como ele mora, todo o contexto no qual a pessoa vive para, então, completar um diagnóstico e acompanhar a evolução. Hoje existem mais recursos e tudo funciona mais rápido, mas há uma distância maior entre o médico e o cidadão atendido”, explica, concluindo que o contato médico-paciente deve prevalecer. “Bons médicos olham para o paciente, tocam nele. Eu penso assim porque também vou ao médico e gosto desse tipo de atendimento”, diz.
Ele considera que o profissional já não conta com a mesma proximidade que tinha com a população em outra época. “Eu atendo, aqui na UBS, netos e bisnetos de pacientes que nasceram em minhas mãos, porque na Brasilândia estamos próximos ao Imirim, onde atuava. E eles falam: ‘o senhor tinha a liberdade de ir à nossa geladeira e pegar um copo de leite e até beliscar uma batata no fogão’. Era assim na época, hoje estamos muito mais distantes e é muito raro o médico visitar os pacientes. Eles é que vêm até nós”, pontua.
Conhecimento
Segundo o agente comunitário Elivelton Aparecido dos Santos, que integra a equipe do médico há um ano e três meses, a dedicação é o maior diferencial em seu trabalho. “Ele é bem simpático, alegre. É muito atencioso e, apesar de trabalhar muito, está sempre com um sorriso no rosto. Se o paciente não tem consulta marcada, tenta abrir uma exceção”, diz. E o tratamento gentil se estende aos colegas de trabalho. “Aprendi muito com ele, é um ótimo profissional, professor e amigo”, relata.
Malva pensa na troca de conhecimento entre as diferentes gerações como uma evolução natural e necessária. “A gente ajuda fazendo o que pode, porque eu também fui muito ajudado. Hoje não há aquela distância entre professor e aluno, não tem aquela cátedra”, explica.
Ele acredita que sua vivência lhe dá subsídios para ajudar os pacientes porque, na profissão, muitos procedimentos continuam iguais em relação ao começo da carreira. “Alguns casos antigos se repetem exatamente iguais; e o que estava errado, continua do mesmo jeito. Precisaríamos evoluir para atender melhor e de forma mais humana a quem necessita. Hoje eu tenho 60 anos de Medicina, meus companheiros e pacientes me ajudam a continuar. Muitos me dão a mão. Às vezes, o doente só precisa de alguns minutos, uma receita ou um sorriso”, conclui.