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CAPA

PONTO DE PARTIDA (pág.1)
Renato Azevedo Júnior - Presidente do Cremesp


ENTREVISTA (págs.4 a 8)
James Drane


EM FOCO (págs.9 a 11)
Dormiu bem?


CRÔNICA (págs.12 a 13)
Tufik Bauab*


MÉDICOS NO MUNDO (págs.14 a 17)
Irène Frachon


DEBATE (págs.18 a 23)
Emergência e Regulação: novos desafios dos cursos de Medicina


SINTONIA (págs.24 a 27)
Novas práticas educativas no setor da Saúde


GIRAMUNDO (pág.28 a 29)
Curiosidades de ciência e tecnologia, história e atualidades


PONTO COM (págs.30 a 31)
Informações do mundo digital


HOBBY (págs.32 a 35)
Pediatra escala os maiores picos do mundo


HISTÓRIA DA MEDICINA (págs.36 a 38)
Especialidades médicas


LIVRO DE CABECEIRA (pág.39)
Por Bráulio Luna Filho*


CULTURA (págs.40 a 43)
Moacyr Scliar e Yann Martel


GOURMET (págs. 44 a 47)
Moqueca de camarão


FOTOPOESIA (pág.48)
Poesia anônima na capital paulista


GALERIA DE FOTOS


Edição 63 - Abril/Maio/Junho de 2013

DEBATE (págs.18 a 23)

Emergência e Regulação: novos desafios dos cursos de Medicina

Regulação médica: o que temos e o que falta



 

O paciente grave chega a um pronto-socorro de um hospital que não tem os recursos adequados para o seu caso. O que fazer? Qual hospital mais próximo pode atendê-lo? A resposta está nas centrais de regulação médica, atividade que vem crescendo na capital paulistana e no Estado de São Paulo, mas não está ainda totalmente implantada. Além disso, a falta de especialistas nos prontos-socorros e hospitais, e de leitos em UTIs, são alguns dos problemas enfrentados no dia a dia pelos médicos reguladores, que detêm as informações dos recursos disponíveis no município ou na região e decidem para onde o paciente deve ser levado. Capacitação, quem paga a conta, os baixos salários dos médicos de emergência, falta de entendimento do papel do profissional regulador por parte da população, e mesmo de seus colegas que trabalham na ponta; prontos-socorros lotados porque pacientes com quadros simples competem com outros graves são algumas das muitas deficiências da área, abordadas neste debate promovido pela Ser Médico, que contou com a participação da médica Maria Cecília de Toledo Damasceno, membro da Câmara Técnica de Urgência e Emergência do Cremesp e assistente técnico da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo; e Adalgisa Borges Nogueira Nomura, membro da Câmara Técnica de Urgência e Emergência do Cremesp e coordenadora da Urgência e Emergência da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo; com a mediação do médico cirurgião geral e conselheiro do Cremesp, Renato Françoso Filho.


Renato Françoso: Nosso sistema de saúde implica integração entre vários recursos. Dentre eles, precisamos de um sistema de regulação para levar os pacientes de urgência aos locais que tenham o melhor e mais adequado atendimento, e que seja resolutivo. Na teoria, temos um sistema racional e inteligente, mas que, na prática, não funciona. Os médicos da ponta têm uma enorme dificuldade em fazer com que seus pacientes cheguem aos estabelecimentos hospitalares mais adequados para cada caso. O médico regulador nem sempre sabe, exatamente, onde esses recursos estão disponíveis, porque não tem o controle sobre os leitos, sobre as especialidades etc. E o médico do serviço referenciado tem uma demanda com a qual ele, muitas vezes, não contava e, então, não pode oferecer o que foi contratado, pois faltam especialistas ou leitos, dentre outros problemas. Por isso, o Cremesp considera importante discutir esse tema e colaborar na busca de soluções. Como vocês veem esses problemas?

Adalgisa: Eles realmente existem. É preciso definir, primeiramente, que regular é dar regras, é nortear. No caso da saúde, é procurar o que o paciente necessita, com resolutividade, e o mais próximo possível de sua moradia. As ferramentas do médico regulador são os mapas dos recursos existentes. Já avançamos bastante, mas as grandes dificuldades são a falta de profissionais, de vagas em UTI, prontos-socorros lotados e a não existência de contrarreferências pactuadas. Em 2009, ocorreu a centralização da regulação das Urgências de todos os Departamentos Regionais de Saúde (DRS), em um espaço físico na cidade de São Paulo. Evoluímos com a incorporação da Central Ambulatorial e com a inserção de todos os Ambulatórios Médicos de Especialidades (AMEs) do Estado de São Paulo, organizando a Central de Regulação de Oferta de Serviços de Saúde (Cross). O movimento atual é a implantação dos Complexos Reguladores nos territórios das Redes Regionais de Atenção à Saúde (RRAS), com incorporação da Central de Urgência, leitos, ambulatórios e todos os recursos existentes dentro de cada território.
 


"Avançamos bastante, mas ainda faltam profissionais e vagas em UTIs"
 

Françoso: Também faltam leitos?

Cecília: De terapia intensiva faltam, sim. Mas com exceção desses, não.

Adalgisa: Acredito que a reorganização das redes de Atenção ajudará muito. O Ministério da Saúde está reformulando, por meio da Portaria 1.600, a Política Nacional de Atenção às Urgências, e está instituindo a Rede de Atenção às Urgências no Sistema Único de Saúde (SUS). A rede envolve a relação entre os vários componentes, a saber: pré-hospitalar móvel, pré-hospitalar fixo – Unidade Básica de Saúde (UBS) e Unidade de Pronto Atendimento (UPA) –, e os leitos de retaguarda clínica, de UTI e de cuidados prolongados. A rede tem um olhar de integração perante eles, além de recursos de investimento e custeio. Tem também, como prerrogativa, a organização do fluxo e a regulação de todos os recursos envolvidos.

Françoso: Há pactuação entre os vários níveis de governo?

Adalgisa: Sim, temos serviço sob gestão estadual e outros municipais. A regulação deve trabalhar em cogestão, identificar o serviço, disponibilizar cotas pactuadas entre os municípios envolvidos e combinar, previamente, quem vai regular o quê.



Maria Cecília de Toledo Damasceno, Renato Françoso Filho e Adalgisa Borges Nogueira Nomura
 

Françoso: Quem paga a conta?

Adalgisa: Esse é o problema, quem paga? Geralmente, o município que tem mais serviços de saúde é uma cidade polo, onde os habitantes da região vão gastar, principalmente no final de semana. É lá que fazem suas compras, alimentam-se, divertem-se, enfim gastam seu dinheiro. É onde, também, podem ocorrer mais acidentes, provocando a necessidade de intervenção médica. Aí fica uma briga sobre quem vai pagar... Penso que, por ter uma economia mais forte, essa conta já está paga.

Françoso: O gestor diz: “os pacientes que chegam não são apenas do meu município, mas de toda a região. Eles vêm, usam o meu serviço ambulatorial, o meu serviço referenciado, o meu serviço de urgência-emergência e o eletivo. Nós pagamos a conta, mas nossos recursos são finitos”.

Cecília: Todo recurso é finito, não só o dele. No Estado de São Paulo, estamos avançando em relação a essa questão. Unificamos, há quase um ano, a informação do recurso disponível ao atendimento pré-hospitalar. Por exemplo, na cidade de São Paulo, o SAMU paulistano, a Central de Regulação do Estado e a do Município, assim como o Sistema Resgate, que a Secretária Estadual da Saúde tem desde 1989 – enxergam a mesma informação. Até o início de 2012, a informação era via fax, que não era confiável, e, pior, não era passível de rastreamento. Agora, cada hospital tem uma plataforma própria e um médico que informa essas centrais de regulação. É uma informação rastreável, inclusive no que se refere ao horário em que ela foi prestada, assim como o nome e o CRM do médico que a prestou. E estamos trabalhando para que ela seja ainda mais fiel. Por exemplo, colocando alguns filtros na informação que o hospital fornece, de forma que o regulador do sistema pré-hospitalar tenha acesso a dados confiáveis e possa regular melhor esse sistema. O Estado começou a implantá-lo também no Interior e no Litoral. Até o final do ano, todos os serviços do Estado estarão integrados nessa plataforma, de forma que será possível conferir o todo e ter uma informação completa. Outra vantagem é que o hospital pode, a qualquer momento, mudar o seu perfil. Os prontos-socorros são muito dinâmicos e podem ter um problema que dali a meia hora não existirá mais. Com a nova plataforma, as informações podem ser atualizadas online, a qualquer momento. O pessoal da Central de Regulação enxerga o que está acontecendo em cada hospital em tempo real.
 


"A emergência e a regulação deveriam ser ensinadas na faculdade de Medicina"
 

Françoso: Qual a garantia de que o gestor hospitalar vai fornecer essas informações?

Cecília: Uma das garantias é que isso está sendo colocado em contrato. Portanto, ele é obrigado a fornecer a informação, inclusive vinculada ao repasse financeiro e a uma série de outras questões relativas à qualidade do atendimento. A outra é a auditoria. Todas as informações devem ser checadas, para serem mais confiáveis. Essa nova plataforma integrada e online é um grande progresso. Às vezes, o médico regulador não via sequer os recursos que tinha dentro do próprio hospital. Era comum ter um PS cheio e leitos vagos na enfermaria do mesmo hospital, porque existia um distanciamento dessa informação, internamente. Agora, todos os hospitais estão inserindo seus leitos no “Módulo de Leitos”, que fica na Central de Regulação do Estado, também online. Dessa forma, o médico regulador enxergará todos os leitos disponíveis.

Françoso: Estamos falando de hospitais públicos... E os hospitais conveniados, como as Santas Casas, e os hospitais particulares?

Cecília: As Santas Casas do Interior já estão inseridas nessa plataforma de visualização de leitos e serão integradas ao módulo pré-hospitalar até o final deste ano. Os hospitais privados ainda não estão inseridos.

Adalgisa: O Ministério da Saúde, por meio do Projeto SOS Emergência, está trabalhando aqui em São Paulo com dois hospitais, a Santa Casa de São Paulo e a Casa de Saúde Santa Marcelina. Eles receberam verbas para se adequarem ao projeto, colocando os leitos de retaguarda clinica e UTI na regulação. A proposta é ter Complexos Reguladores Regionais que deverão agregar todos os estabelecimentos de Saúde das RRAS. O Complexo Regulador Estadual fará o monitoramento de 11 Complexos Reguladores Estaduais e acolherá apenas o que não for resolvido nas respectivas regiões.



"Na teoria temos um sistema racional e inteligente, mas que, na prática, não funciona"
 

Françoso: Quem vai gerir essa pactuação e esses recursos são os DRS. Vão fazer a pactuação com os prefeitos, com os prestadores... Mas a quem cabe o treinamento do pessoal operacional, dentre os quais o médico regulador?

Adalgisa: Cada complexo regulador deverá ter um núcleo de capacitação permanente. Penso que o Estado e o Cosems/SP deverão elaborar um manual de regulação com a finalidade de alinhar conceitos e definir regras para um entendimento único.

Cecília: No atendimento pré-hospitalar, o Estado tem o Resgate, composto por médicos e enfermeiros civis, por membros da Polícia Militar, por meio do Corpo de Bombeiros e do Grupamento de Rádio Patrulha Aérea, popularmente conhecido por Águia, que tem pilotos e enfermeiros militares e um médico civil da Secretária da Saúde. É um sistema interessante em termos de atendimento à complexidade, porque é muito rápido. Temos uma base no Campo de Marte, na cidade de São Paulo, e outra em Campinas. Há poucos dias, o governo estadual anunciou que o interior do Estado terá mais nove bases: Araçatuba, Presidente Prudente, Piracicaba, Sorocaba, Praia Grande, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, São José dos Campos e Bauru. Ao final, cada grupo trabalhará em um raio de aproximadamente 60 km, feito em 20 minutos por helicóptero. Será possível resgatar os pacientes – geralmente, nesses casos, muito graves – a uma distância maior, sem gastar muito tempo, e levá-los para o recurso mais adequado. Na Capital, a maior parte dos pacientes atendidos por esse sistema, levados para o HC, tiveram alta para casa. O treinamento desses profissionais é feito pela Secretaria da Saúde e pela Secretaria de Segurança Publica, tendo várias etapas, incluindo a da regulação médica, além de reciclagem permanente.

Françoso: Há disponibilidade de especialistas?

Adalgisa: A Central de Regulação é o observatório do sistema de saúde, que identifica, por exemplo, ausência de neurocirurgião em uma região, de leitos de UTI em outra etc. Essas informações são repassadas aos gestores do Estado e do respectivo município, porque regulação é uma coisa, gestão é outra, não dá para confundir.

Cecília: A plataforma utilizada pelas centrais permite ver de forma integrada e gera relatórios que mostram as deficiências de cada região. Assim podemos focar a estrutura na busca desses especialistas.

Françoso: O que pode ser feito para melhorar a disponibilidade de recursos e fazer com que essa regulação possa atender com mais rapidez e efetividade?

Adalgisa: Uma coisa já está sendo feita, que é a descentralização. Todo município, independente do seu porte, deve ser responsável pelo destino do munícipe. Ou seja, acompanhar se foi atendido, se foi solicitado algum exame, e se necessita de cirurgia ou não. Cada município deve, também, dar conta do básico. A alta complexidade deve ser organizada em interfluxo regional. Outra coisa é a necessidade de capacitação. Temos o curso básico Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria (RCAA) do Ministério da Saúde, que é um grande instrumento, de fácil acesso.
 


Françoso: Há médicos treinados adequadamente para atender a demanda de urgência e emergência?

Cecília: Hoje faltam médicos, talvez porque as condições salariais não sejam atrativas. É um problema grave porque a emergência é imprevisível. Em um momento, o plantão está tranquilo, mas dali a meia-hora pode estar um tumulto, com excesso de pacientes. O profissional precisa ter um determinado perfil e tem de gostar disso. É um trabalho bastante desgastante e deveria ser muito bem remunerado. Existem, nas emergências, vários profissionais que estão lá fazendo um “bico”. É um lugar onde é preciso tomar decisões rápidas e corretas, senão, o paciente talvez possa morrer. Nesse sentido, há falta, sim, de profissionais adequadamente preparados.

Françoso: Há mais falta de algumas especialidades do que outras nos serviços de urgência?

Cecília: Na cidade de São Paulo, a Neurologia, a Ortopedia e a Cirurgia Vascular são algumas das especialidades com mais “buracos” nas escalas.

Françoso: Além da questão salarial, as condições de trabalho nos hospitais que ficam em áreas de maior risco, do ponto de vista da violência e da segurança, é também um complicador?

Cecília: Seguramente. As queixas de agressão contra médicos subiram muito nos últimos anos.

Adalgisa: Outra questão relevante é que a regulação precisa ser mais divulgada para que os médicos e os prestadores entendam qual sua função e a necessidade de sua existência. Muitas famílias não compreendem que, às vezes, é necessário deslocar um paciente para outra cidade, longe da sua moradia, para garantir um recurso mais adequado de atendimento. É lamentável também que problemas judiciais cheguem à mesa do regulador e que, por falta de recurso, o médico seja penalizado.

Cecília: Às vezes é preciso tirar o paciente de uma UTI na qual ele tem recursos assegurados porque a família quer que ele vá para a UTI de outro hospital, que não tem vaga, e o juiz concorda com isso. Quanto aos médicos, a emergência e a regulação deveriam ser ensinadas na faculdade de Medicina. São poucas as que abordam esses temas. O recém-formado que vai exercer a medicina na emergência não conhece os princípios básicos que norteiam uma regulação médica.

Adalgisa: É preciso dar um salto de qualidade nessa questão da capacitação, não só para o médico regulador, mas também para o médico que está na outra ponta, para ele entender que o médico regulador tem um papel e ele tem outro.

Françoso: E reconhecer a autoridade do médico regulador.

   Adalgisa: Sim, exatamente. O médico da ponta precisa saber que o hospital onde trabalha tem de atender, sim, o paciente de outra região, porque isso foi pactuado. Além disso, não podemos esquecer que é preciso fortalecer a atenção básica e a organização de fluxos de acesso para níveis hierárquicos de atenção, porque a regulação é o último degrau de possibilidade de encaminhar o paciente para local mais adequado para o atendimento, na inexistência ou escassez do recurso disponível nas grades de referências regionais.

 

Cecília: A população precisa ser orientada a procurar o recurso correto para a sua doença. Na Europa, o paciente não chega a um pronto-socorro sem passar por um médico de família, primeiramente, ou por um recurso de menor complexidade. É uma distorção o paciente decidir para onde ele vai como acontece no Brasil. Em estabelecimentos de altíssima complexidade, doentes com patologias simples competem com outros, gravíssimos.

Françoso: Agradecemos imensamente a participação de vocês e esperamos ter colaborado para aprimorar a regulação médica em nosso Estado e municípios.


Fotos: Osmar Bustos

 


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