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Renato Azevedo Júnior - Presidente do Cremesp


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Marcel de Souza


CRÔNICA (pág.11)
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Márcio Melo*


CONJUNTURA (pág.15)
Abuso sexual


DEBATE (pág.18)
Doença negligenciada


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Curiosidades da ciência e tecnologia, da história e da atualidade


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HISTÓRIA DA MEDICINA (pág.28)
Tributo a John Snow


HOBBY (pág.31)
Entre o hospital e o hipismo


SUSTENTABILIDADE (pág.34)
Uma casa ecológica


LIVRO DE CABECEIRA (pág.37)
Dicas de leitura da Redação


CULTURA (pág.38)
É DO BRASIL!


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CARTAS & NOTAS (pág.43)
Exame do Cremesp agora é obrigatório


TURISMO (pág.44)
Mato Grosso do Sul


FOTOPOESIA (pág.48)
Odylo Costa, filho


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Edição 60 - Julho/Agosto/Setembro de 2012

ENTREVISTA (pág.5)

Marcel de Souza

“Basquete é amor,  Medicina é missão”

“Basquete é amor incondicional, Medicina, missão”. “O basquete sempre estará ligado à minha vida, mas a Medicina me dá paz”. Assim, o ex-jogador da Seleção Brasileira de Basquete e médico, Marcel de Souza, resume sua vida como o segundo maior “cestinha” da história do basquete nacional –  apenas superado por seu ex-colega de Seleção, Oscar Schmidt –, e como clínico geral e radiologista, formado pela Faculdade de Medicina de Jundiaí, com especialização na Fmusp. Além da Seleção Brasileira, Marcel jogou no Esporte Clube Sírio e em outros times nacionais. No exterior, atuou pela Bradley University, nos Estados Unidos, e nos times italianos Alno Fabriano e Indesit Caserta. Participou de quatro Olimpíadas e cinco campeonatos mundiais, dentre outras importantes disputas esportivas. Hoje, aos 55 anos – depois de trabalhar durante  anos como técnico de basquete – , dedica-se principalmente à Medicina, mas continua vinculado ao esporte, mantendo o site www.databasket.com.br.

É casado, pela segunda vez, com a médica Fabiana Camilo, e tem uma filha do primeiro casamento, Gabriela, casada com o também jogador da Seleção Brasileira de Basquete, Giovannoni. Nesta entrevista à Ser Médico, ele conta fatos de suas duas carreiras, como conseguiu conciliá-las e o que transferiu do basquete para a Medicina e vice-versa.

  Ser Médico: O senhor começou a jogar basquete muito cedo, aos cinco anos. Foi influência de seu pai?
Marcel de Souza
: Não existe nenhum estudo científico provando que o talento existe. O importante, nessa área e em outras, é o treinamento e o tutor. Pode ser o pai, como foi o meu caso. Mas pode ser a mãe, um professor, um tio ou uma pessoa ligada à família, que pega aquele ser que está em desenvolvimento e vê nele a vontade de progredir e promove isso. Meu pai, Romão de Souza, jogou no Esporte Sírio, onde também atuei. Era um jogador mediano, nunca fez parte da Seleção Brasileira. Ele me disse: ‘você quer jogar? Então treine...´. Ele também me incentivou a fazer uma faculdade.

  SM: Deixou de fazer muitas coisas na adolescência por causa do basquete?
Marcel:
Tudo. Meu pai falou que, se eu quisesse jogar basquete, tinha de treinar e estudar. Não sobrava muito tempo para outras coisas. Passei minha adolescência e juventude dentro das quadras. Isso é comum entre atletas e músicos, a dedicação tem de ser total. Você perde, inclusive, aquela parte de amadurecimento emocional e depois tem de resgatá-la. Brinco dizendo que virei adulto aos 47 anos, quando comecei a exercer a Medicina. Até então eu era adolescente. Fiz análise, porque chega uma hora em que a cabeça não está compatível com o que está acontecendo.

SM: Como conciliou o basquete e os estudos para passar em um vestibular tão difícil?
Marcel:
Acredito muito que quando você faz suas opções de vida os caminhos se abrem. Isso aconteceu comigo no basquete e na Medicina. Jogava no Esporte Clube Sírio e era um dos melhores jogadores da época. Mas, como na Seleção eu era reserva, apesar de ser “cestinha”, meu tutor disse: “tá bom, então ele vai esperar a vez dele nos Estados Unidos”. Fui, então, jogar no time da Bradley University daquele país e as portas abriram-se para mim. Quando cheguei lá e os caras falaram que eu ia ser profissional, a turma daqui ficou desesperada porque profissional não jogava com amador, e eu não poderia jogar na Olimpíada etc. Voltei dos EUA em 1976 e fiz cursinho durante o ano inteiro, estudando como maluco. Tinha ficado dois anos sem estudar e já tinha quatro anos de Seleção quando passei no vestibular. Entrei na 9ª turma da Faculdade de Medicina de Jundiaí em 1977, aos 21 anos.

SM: Como fazia para acompanhar o ritmo puxado da faculdade?
Marcel:
Quando passei no vestibular pensei: “bom, agora que entrei, vou continuar com o basquete e, com a Medicina, vou devagar”. Mas tive um choque porque comecei a gostar do curso e, ao mesmo tempo, fui ficando atrasado em relação aos meus colegas, pois tinha de participar dos jogos da Seleção Brasileira e do Sírio. Faltava a aulas e perdia muita coisa na faculdade. Pensei: “Nossa Senhora, isso aqui vai ser difícil”. Felizmente, tive muita ajuda da minha turma. Inclusive, um grupo de meninas se organizou para me dar uma mão. Eu ia até a república delas e elas me ajudavam a estudar o que havia perdido. Meu cotidiano ficou assim: ia à faculdade de manhã e à tarde, em Jundiaí, e, à noite, vinha treinar em São Paulo. Aí, voltava para Jundiaí e estudava até às três horas da madrugada. Enquanto não estávamos no internato deu certo, mas quando este começou, só Deus sabe como consegui terminar o curso. Vivia feito um zumbi, mas mesmo assim consegui me formar, em 1982.

SM: E depois da faculdade?
Marcel:
Quando terminei o curso, estava em tal estado que pensei: “agora não dá mais, vou ficar só no basquete”. Logo depois, em 1984, fui jogar na Itália, mas continuei integrando a Seleção Brasileira. Nas Olimpíadas de 1992, em Barcelona, estava conversando com os médicos da delegação brasileira que lá estavam, quando o ortopedista, dr. Carazzato, me perguntou: “Marcel, o que você vai fazer daqui pra frente?” Porque eu já estava com 34 anos. Respondi que não sabia se continuava jogando ou se virava técnico. Ele me indagou sobre a Medicina e eu disse que terminara há anos e nunca trabalhara como médico. Como ele era da pós-graduação lato sensu da Medicina da USP, me incentivou a fazer uma especialização lá. Pensei: “USP? Imagina!” Voltamos ao Brasil e continuei a jogar. Um dia, fomos jogar no Monte Líbano. Quando saía do estacionamento, levantei os olhos e vi uma placa do outro lado da rua: Clínica Carazzato. Cismei: “Ah! Isso é um sinal”. Fui até lá e ele me recebeu muito gentilmente, mostrou-me a clínica e, durante a conversa, acabei dizendo que pensava fazer Radiologia. Ele conversou com o pessoal da Radiologia da USP e, alguns dias depois, chamaram-me para uma entrevista. Em seguida, ofereceram-me a vaga “pelos serviços que prestei ao país”. Foi assim que me especializei em Radiologia e fiquei cinco anos no HC.

SM: Exerceu a Medicina logo depois da especialização?
Marcel:
Logo depois, não. O Oscar Schmidt (que fez dupla com Marcel na Seleção Brasileira de Basquete) me convidou para ser diretor do Pacaembu, e eu larguei, em 1997, o Inrad do HC. E pensei: “não acredito que fiz isso”. Comecei também a me dedicar à carreira de técnico de basquete. E não tive muito sucesso porque não entendi o papel do técnico aqui no Brasil, que é mais político, e os jogadores não me entenderam. Procurava passar uma forma de jogar. Joguei na Itália e não virei italiano. Joguei nos Estados Unidos e não virei norte-americano. Procurei incorporar, como jogador, o que tinha de melhor nos dois países. Não é imitação. O brasileiro tem uma criatividade acima da média. Então vamos incorporar o que eles fazem bem e unir com o que temos de melhor, senão viramos robôs. Não significa que treinamos errado, mas nossa intensidade é muito menor. É muito importante o tempo, a qualidade e a intensidade do treino. Mas esse foi um capítulo encerrado na minha vida. É preciso entender que, em algumas situações, não devemos ser teimosos. Por exemplo, quando falamos e ninguém acata porque não entende.

SM: Ainda joga, como hobby?
Marcel
: Não. Tenho um joelho muito ruim, que foi operado duas vezes.

SM: Quando assumiu realmente a carreira médica?
Marcel:
Foi em 2004, na época em que trabalhei como médico de família, um aprendizado riquíssimo.

SM: Como seus pacientes o veem?
Marcel:
Alguns mais velhos me reconhecem, principalmente quando exibem alguma reportagem na televisão na qual apareço. Fazem algum comentário, mas sabem dissociar. Os mais novos não me reconhecem e não sabem quem sou. É uma vantagem. Tampouco fico falando “olha, eu fui jogador”. Não fui nada, estou ali no consultório para ajudar o paciente.

 SM: O que levou da Medicina para o basquete e vice-versa?
 Marcel:
Praticamente tudo. O esporte em si – não só o basquete – ensina muita coisa, além das coisas óbvias como hierarquia, disciplina e respeito às regras do jogo. Pelo meu físico, não deveria estar no lugar onde estou no basquete brasileiro. Sempre surgia alguém mais alto, mais forte, que pulava mais que eu, ou mais rápido. Então, desenvolvi um sentido muito apurado do jogo em termos técnicos e mesmo de sensibilidade. Sabia o que estava acontecendo e o que ia acontecer numa jogada, porque estudava muito. E isso não tem preço para a Medicina. O paciente de hoje não é como o de antigamente. Seja de qualquer nível social, ele pergunta, pesquisa e estuda, principalmente na internet, sobre o diagnóstico que o médico deu. Exige um tipo de atenção e de sensibilidade que você precisa dar a ele. Não é só “você faz uma queixa, eu faço o exame, pergunto umas coisas e dou o remédio”. O esporte ajuda nisso, porque tem camaradagem e companheirismo. O técnico não é só o cara que sabe. A relação médico-paciente mudou. O médico também não é só o cara que sabe. Ele está lá o aconselhando a fazer as coisas... Eu levei isso do esporte para a Medicina. Às vezes, o paciente espera uma repreensão do médico. Mas, em vez de ficar dando bronca, adaptei muitas coisas do esporte para a prática médica. Quando era técnico, falava aos jogadores que queriam solução para os problemas: “eu faria assim, mas não sou mais jogador. E você, vai fazer de qual jeito?”. Como médico, digo ao paciente: ‘não posso ajudá-lo mais do que você quer ser ajudado. Estou lhe mostrando aqui os resultados...”.

SM: E levou alguma coisa da Medicina para o esporte?
Marcel
: Levei para o esporte o hábito de estudar. Qualquer médico deve ter estudado muito. No HC, tive contato com médicos que tinham no currículo somente médias acima de nove. E isso você leva para outras áreas. Levei isso para o basquete. Estudei tudo, pois é um esporte muito visual.

SM: Qual foi sua maior emoção como jogador profissional?
Marcel:
Tive dois momentos especiais na minha carreira. Um, pessoal, foi a cesta que fiz em 1978, que deu uma medalha de bronze para o basquete masculino brasileiro no Campeonato Mundial. Outro foi no Pan Americano, em 1987. Estávamos no auge da forma e conseguimos a medalha de ouro, vencendo a seleção norte-americana em uma final histórica. Esses dois momentos me dão a certeza de que se eu cismar de fazer uma coisa, eu consigo. Dá uma segurança muito grande. E isso é transmitido à vida cotidiana, à clínica, à casa e ao relacionamento. As pessoas veem que você realmente é capaz. É melhor do que qualquer medalha.


Marcel e o pai, Romão de Souza, também jogador de basquete

SM: Como vê a Medicina hoje?
Marcel:
Tive pelo basquete um amor incondicional e minha vida estará sempre ligada a esse esporte. Em relação à Medicina, sinto que tenho uma missão. E a missão não é você que escolhe, é ela que o escolhe. Quando eu jogava nos Estados Unidos, teve um dia, em 1976, em que estava no vestiário da universidade, olhei-me no espelho e disse a mim mesmo: “você tem cara de médico”. Foi assim que, ao voltar ao Brasil, quis ser médico. Sempre que precisei de alguma coisa, lá estava a Medicina. A missão estava lá. Quando tive um momento de crise, fiz a especialização. Em outro momento de reavaliação, comecei a trabalhar como médico. E somente sou realizado como pessoa por causa do meu trabalho como médico. Na Medicina, encontro paz. Na Medicina, sei quem eu sou. Levei tempo para descobrir, mas as evidências me mostraram isso. Não existe lugar em que eu seja mais eu do que exercendo a Medicina. Quando você encontra isso, passa a ser o ar que você respira. Não importa que ganhe pouco, não interessa que tenha cinco empregos. Você está praticando Medicina não pelo paciente, mas por você. Quem precisa tratar o paciente sou eu. Estou aprendendo com ele, e me tornando uma pessoa melhor. Porque é uma missão.

SM: Onde o senhor trabalha atualmente?
Marcel:
Sou concursado pela Prefeitura Municipal de Jundiaí e trabalho na Unidade Básica de Saúde (UBS) da Vila Comercial. Dou plantões no Hospital Paulo Sacramento, trabalho como radiologista na Santa Casa de Itatiba e em uma clínica de saúde ocupacional.

SM: Também faz palestras... Onde e quais temas costuma abordar?
Marcel:
Falo, principalmente, sobre talento e treinamento. Procuro vincular à minha vida no basquete e na medicina. Por exemplo, os temas das duas últimas foram: O talento não existe e Motivação e rendimento. Dou as palestras onde me chamam, escolas, empresas, prefeituras.

SM: O que abordaria em uma palestra para médicos?
Marcel:
Amor e missão.


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