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CAPA

PONTO DE PARTIDA (pág. 1)
Encontro nacional em Brasília fortaleceu as reivindicações da categoria


ENTREVISTA (pág. 4)
Paulo Hoff, diretor clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octávio Frias de Oliveira


MEIO AMBIENTE (pág. 9)
Encontro discutiu consumo de alimentos geneticamente modificados


CRÔNICA (pág. 13)
Tufik Bauab - Presidente da Sociedade Paulista de Radiologia e Diagnóstico por Imagem


SAÚDE NO MUNDO (pág. 14)
Tebni Saavedra descreve o sistema público de saúde do Chile


DEBATE (pág. 14)
A autonomia dos médicos e a prescrição racional de medicamentos


HISTÓRIA (pág.23)
A evolução dos estudos voltados para a saúde pós-período renascentista


GIRAMUNDO (pág. 26)
Curiosidades da ciência, da história e da atualidade


PONTO COM (pág. 28)
Canal de atualização com as novidades do mundo digital


SINTONIA (pág. 30)
Antonio Francisco Lisboa: maior escultor barroco mineiro do final do século XVIII


MÉDICOS EM FOCO (pág. 36)
Uma análise da temática médica, quando foco principal das séries televisivas


HOBBY (pág. 40)
Guerrini, o colecionador de conchas, já contabiliza mais de 10 mil peças


TURISMO (pág. 42)
Agende suas próximas férias para o interior paulista e aproveite o contato com a natureza


CABECEIRA (pág. 47)
Sugestão de leitura da conselheira Ieda Therezinha Verreschi*


FOTOPOESIA (pág. 48)
Cantares - Antônio Machado


GALERIA DE FOTOS


Edição 52 - Julho/Agosto/Setembro de 2010

ENTREVISTA (pág. 4)

Paulo Hoff, diretor clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octávio Frias de Oliveira

“A individualização do tratamento possibilitará a cura dos tumores cancerígenos”


Paulo Hoff: uma das especialidades mais importantes será a bioinformática, associada à bioestatística


“Está claro que os tumores têm características moleculares variadas, apresentam-se de maneira distinta, suas causas são diferentes e a evolução não é a mesma; portanto, não é inteligente tratá-los da mesma forma. Haverá, cada vez mais, uma individualização dos tratamentos médicos, principalmente em relação ao câncer”, declara o professor titular da disciplina de Oncologia Clínica da USP,
Paulo Hoff. Diretor clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octávio Frias de Oliveira; e diretor do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, Hoff possui mais de 120 artigos indexados em revistas internacionais e 11 livros publicados. Formado na Universidade de Brasília, fez residência em Clínica Médica, na Universidade de Miami, e em Oncologia e Hematologia, na Universidade do Texas. Em entrevista à Ser Médico, ele traçou um panorama da situação atual e das perspectivas terapêuticas em Oncologia.


Ser Médico: Quais são as perspectivas terapêuticas em Oncologia?
Paulo Hoff:
Há uma mudança epidemiológica nesse momento: o câncer está se tornando rapidamente a causa mais frequente de morte, não só nos países mais desenvolvidos, mas nos emergentes, como o Brasil. Existe também um grande interesse, tanto de governos como da indústria farmacêutica e de instituições de pesquisa e ensino, na descoberta de novas opções de tratamento. Estamos começando a ver os frutos desse esforço. A expectativa de cura de um paciente com câncer, hoje, é a mais alta desde que a medicina começou a enfrentar o problema. Mas, certamente, ainda é menos do que se desejaria. Curamos mais ou menos 60% dos pacientes com câncer. Obviamente este número é diferente para os pacientes que têm um diagnóstico precoce em relação àqueles com tumores avançados. E, mais importante ainda, há um processo rápido de cronificação de alguns tumores com as normas terapêuticas, como aconteceu com outras doenças, como a Aids, pressão alta, diabetes, entre outras.

SM: Em quais tipos de tumores ela acontece?
Hoff:
Acontece, por exemplo, com o tumor do estroma gastrointestinal, cujo acrônimo é GIST. Há cerca de 10 anos, discutia-se sua existência, pois é muito parecido com alguns tipos de leiomiossarcoma. Na última década, descobriu-se que esse tumor realmente existia e que se originava, quase sempre, de uma alteração em um receptor celular, chamado C-kiet. Identificou-se, então, uma medicação que bloqueia esse receptor, que está anormalmente ativado e passa, constantemente, para a célula a mensagem: replique, se multiplique, invada, metastatise. Quando o paciente usa esse remédio – e agora já não é apenas um, temos pelo menos quatro que têm atividade nessa doença –, ele bloqueia o receptor. Este ainda está lá, alterado, mas não consegue transmitir a mensagem porque sua sequência foi interrompida. É como se você tivesse um mal contato numa tomada e cortasse o fio. Quando está muito avançado, não conseguimos matá-lo completamente, mas ele fica sob controle durante anos. Isso é cronificação. Este é apenas um exemplo, pois novas medicações conseguiram mudar a história natural de muitos tumores.

SM: Mas o paciente não pode parar de tomar o medicamento...
Hoff:
Infelizmente, não. Na cronificação, é preciso continuar tomando medicamento porque a doença continua existindo. Às vezes, você não a vê, mas ela continua existindo, microscopicamente, e, infelizmente, com potencial de retornar.

SM: A cronificação é possível em relação a quais outros tipos de tumores?
Hoff:
Por exemplo, câncer de mama avançado. Nesse caso, é uma doença incurável porque, obviamente, o câncer de mama precoce é altamente curável. Mas hoje, mesmo ele estando disseminado, a expectativa de vida é acima de três anos. Pacientes com câncer de intestino ou cólon intestinal tinham uma expectativa de vida, há 15 anos, entre seis e 12 meses. Hoje estamos nos aproximando de 30 meses. Quais são os problemas desse processo? O uso continuado de medicamentos, que gera, às vezes, problemas de aderência do paciente. Além disso, as novas medicações são muito caras, o que provoca uma pressão principalmente das fontes pagadoras, sejam elas particulares ou públicas.
 
SM: Quais são as perspectivas da pesquisa na especialidade? Apontam para a cura de determinados tumores?
Hoff:
Está muito claro para onde estamos indo. Não sabemos quando nós vamos chegar lá, mas conseguiremos, sim, a cura da maior parte dos tumores. Gostaria de ressaltar que o câncer não é uma moléstia, mas um conjunto de doenças com características similares. Então, dificilmente haverá uma cura do câncer. Vão existir curas para os cânceres. Hoje, quem tiver um câncer de testículo avançado tem uma excelente possibilidade de cura completa. Poderá parar de tomar remédio e ter uma vida normal depois do tratamento. Já se você tiver um câncer de pâncreas, essa possibilidade é muito, muito pequena. Poucos tumores têm possibilidades intermediárias. O que veremos, progressivamente, são mais e mais tumores sendo controlados ou cronificados. E, posteriormente, uma evolução natural para um ponto em que aprenderemos como curar esses tumores. Então, eu acho que vamos curar os cânceres, mas não rapidamente. Será um processo trabalhoso. Estamos numa primeira etapa.


Para Hoff, com a mudança de paradigma, o tratamento convencional também sofrerá mudanças

SM: O que mudou em relação aos últimos anos?
Hoff:
Mudamos de paradigma nos últimos dez anos. Nós começamos fazendo um tratamento muito geral – a quimioterapia convencional –, que atacava o câncer, mas também as células normais. Com ela tivemos alguns avanços, mas rapidamente atingimos o benefício máximo desse tipo de tratamento. Foi necessário, então, o desenvolvimento de um novo paradigma, as terapias moleculares. Estas são importantes não só pelos resultados que proporcionam atualmente, mas pelo fato de, provavelmente, serem as ferramentas que nos levarão à cura dos cânceres. Essa evolução necessitará de um período de muita pesquisa, muito estudo e entendimento. Hoje ainda tendemos a tratar tumores de maneira bastante similar em pessoas diferentes. Não é porque um tumor começou nas mamas de duas mulheres que esse tumor é igual. Hoje está muito claro que esses tumores têm características moleculares diferentes, que eles se apresentam de maneira distinta, que suas causas são diferentes e que a evolução não é a mesma. Portanto, não é inteligente tratá-los da mesma maneira.

O que veremos nos próximos cinco a dez anos é cada vez mais a individualização na medicina, principalmente em relação ao câncer. Nós analisaremos o componente genético do tumor e do paciente e, com esse conhecimento, vamos poder selecionar a terapia que melhor se aplica àquele tumor, naquele paciente. Então, não há a menor dúvida de que essa individualização será a ferramenta que nos ajudará atingir nosso objetivo, que é a cura do câncer. E isso já começou. Hoje, temos testes que analisam o componente molecular genético do tumor e nos permitem fazer uma seleção de remédios que, embora ainda não perfeitos, tratam o câncer de mama, de estômago, de intestino e o próprio GIST, que eu mencionei anteriormente.

SM: Quais são essas ferramentas?
Hoff:
São exames laboratoriais. Estudamos se as células tumorais têm certas alterações específicas que possam ser utilizadas como alvo para uma terapia molecular. São chamadas de terapia-alvo porque foram elaboradas para tratar uma alteração celular específica.

SM: Os laboratórios brasileiros, ou parte deles, pelo menos, estão capacitados para fazer esses exames?
Hoff:
Alguns deles já estão disponíveis no Brasil. O problema é que mesmo em outros países ainda são muito poucos. Estamos numa fase de desenvolvimento de novos exames. Em relação ao câncer, eles podem ser prognósticos ou preditivos. Os prognósticos determinam o que vai acontecer com o paciente em particular. Se ele poderá ir bem ou não. Os preditivos dizem o que ocorrerá com determinado tumor se usarmos algum tipo de remédio específico. Estamos trabalhando, pesadamente, no desenvolvimento de novos marcadores preditivos, que nos permitam fazer a individualização e seleção dos tratamentos dos pacientes.

Necessitamos de mais testes e precisamos validá-los em grandes estudos prospectivos, nos quais possamos confiar. Quando o Projeto Genoma foi feito – e depois o Genoma do Câncer, do qual o Brasil participou ativamente – havia o sonho de que rapidamente utilizaríamos as informações do projeto para aplicar no tratamento de pacientes. O que nós já devíamos ter imaginado, é que a vida é muito mais complexa do que a gente imaginava. Existe uma variedade enorme de alterações genéticas. Nós teremos de selecionar quais delas são realmente importantes e descobrir como atacá-las. Uma das profissões mais importantes do futuro será a bioinformática associada à bioestatística, porque tudo isso terá de ser comprovado em pesquisas.

SM: Esses exames são feitos nos pacientes com um tumor já desenvolvido. As pesquisas apontam, também, para a previsibilidade de um tumor em uma pessoa sã?
Hoff:
Nesse caso, temos de dividir a população em dois grupos. Existem pessoas que têm síndromes familiares, ou seja, está sob risco de tumores hereditários específicos. Para esse tipo de alteração molecular, já temos bons estudos de laboratório que permitem avaliar se os membros da família estão sob risco ou não. Acreditamos que 10% dos tumores se enquadrem nesse tipo de situação, em que há uma influência familiar importante, molecular, para o desenvolvimento do câncer. Os outros 90% certamente têm influência dos genes, mas não determinante. Para esses, é mais difícil prever os riscos. Futuramente, teremos painéis que irão predizer para risco aumentado, mas isso ainda está distante para esses pacientes que não têm síndromes familiares. O que está em avaliação, atualmente, e deve atingir o mercado nos próximos dez anos, é algo intermediário. São estudos moleculares que permitirão a detecção do câncer antes que ele se torne um problema. Um exemplo bem prático: acreditamos que nos próximos cinco anos estará disponível um teste que analisará um pouquinho de fezes do indivíduo e permitirá saber se ele tem uma lesão pré-maligna ou maligna no intestino, sem a necessidade de se fazer uma endoscopia ou uma colonoscopia.

SM: E para quem tem a síndrome familiar quais são os exames?
Hoff:
Infelizmente, é um mito que haverá um teste que determina se a pessoa terá câncer ou não. Os indivíduos que possuem casos de câncer na família deveriam contatar o seu médico para discutir o histórico familiar e ver se há necessidade de encaminhamento a um geneticista, para que este avalie quais testes deveriam ser feitos. Por que isso é importante? Porque cada teste desses custa bastante caro e o resultado terá de ser analisado por um profissional. Nem sempre o resultado é preto no branco. Às vezes, você precisa interpretá-lo. Então, eu encorajaria, sempre, os nossos colegas a tirarem uma boa história clínica. Havendo suspeita de que há uma síndrome genética na família, sugiro fazer um encaminhamento a um colega especializado na área.

SM: Quais outras sugestões daria a seus colegas que não são oncologistas?
Hoff:
Primeiramente, o clínico geral ou o cirurgião geral tem de lembrar que o câncer está rapidamente se tornando a causa mais comum de morte em nossa sociedade. Ainda é a segunda, depois dos problemas cardiovasculares, mas a incidência vem aumentando. Então, da mesma maneira que nós temos total atenção quando um paciente reclama de dor no peito, para saber se ele tem um problema cardiovascular, o médico precisa ficar atento para ver se o paciente possui sintomas que possam indicar a presença de algum tipo de tumor. Uma mulher que se queixa de um nódulo na mama tem de ser levada muito a sério. Um paciente que se apresente com uma anemia inexplicada necessita ser avaliado profundamente. Nossos colegas precisam lembrar que hoje já existem recomendações específicas de exames que devem ser feitos rotineiramente de prevenção ao câncer. Vou listar apenas alguns: papanicolau e mamografia, para as mulheres; toque retal para os homens, que ajuda na detecção de tumor precoce no intestino e próstata; e o PSA, que tem sua real importância discutida neste momento, mas, no Brasil, ainda se recomenda fazer esse exame nos homens acima dos 40 ou 50 anos. É indicado também que pacientes acima dos 50 anos façam exames de prevenção de câncer de intestino. Ou exame de sangue oculto nas fezes anualmente, ou, então, a colonoscopia a cada dez anos. Outro ponto importante é que, às vezes, numa anamnese muito rápida, a gente tende a abordar superficialmente o histórico familiar. Embora 10% dos pacientes tenham síndromes familiares clássicas, muitos outros possuem um risco aumentado, embora não tenham síndrome familiar. Naturalmente, um exame físico pode dar muitas dicas do que está acontecendo com esse paciente.


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