CAPA
EDITORIAL (SM pág. 1)
A mobilização nacional para a revisão do Código de Ética Médica, após 20 anos de existência do documento - por Henrique Carlos Gonçalves
ENTREVISTA (SM pág. 3)
Acompanhe a trajetória profissional e pessoal da pediatra marroquina Najat M’jid nesta entrevista exclusiva
SINTONIA 1 (SM pág. 8)
Web e atividade cerebral: nosso bem ou nosso mal? Tire aqui suas conclusões...
SINTONIA 2 (SM pág. 11)
Jornalismo na área da saúde: é preciso saber separar o joio do trigo antes de divulgar assuntos médicos
CRÔNICA (SM pág. 16)
Príncipe ou plebeu... qual opção lhe traria maior felicidade?!? Veja o que pensa Ruy Castro, em sua crônica, sempre inteligente e bem-humorada
AMBIENTE (SM pág. 18)
Alguns hospitais brasileiros são bons exemplos de atitudes positivas e eficazes na preservação da qualidade do meio ambiente
DEBATE (SM pág. 23)
Encontro sobre violência infanto-juvenil reúne duas especialistas no assunto, sob a mediação do conselheiro Mauro Aranha
EM FOCO (SM pág. 29)
Estação Ciência: passeio transforma visita em experiência única, possibilitando o contato direto - e descomplicado - com o universo científico
HISTÓRIA (SM pág. 32)
Acompanhe nossa visita virtual aos templos ecumênicos agregados a hospitais
CULTURA (SM pág. 36)
A arte e a ciência - que desafiam a lógica - do artista holandês Cornelius Escher
TURISMO (SM pág.40)
Casal de médicos dá dicas incríveis para uma viagem fantástica ao Parque Nacional da Serra da Canastra, em Minas Gerais
CABECEIRA (SM págs. 46 e 47)
Duas sugestões de leitura imperdíveis: O Presidente Negro e Venenos de Deus, Remédios do Diabo
CARTAS (SM pág. 47)
Acompanhe, nesta coluna, alguns comentários recebidos sobre a edição anterior
POESIA (SM pág. 48)
Trecho da obra Réquiem, II, do poeta Lêdo Ivo, foi escolhido para finalizar esta edição
GALERIA DE FOTOS
CRÔNICA (SM pág. 16)
Príncipe ou plebeu... qual opção lhe traria maior felicidade?!? Veja o que pensa Ruy Castro, em sua crônica, sempre inteligente e bem-humorada
Colega de turma
Por Ruy Castro*
Rubem Braga tinha 23 anos incompletos e mal começara a publicar suas primeiras crônicas em jornais. Mas, logo numa delas, escreveu: “A minha vida sempre foi orientada pelo fato de eu não pretender ser conde”. O título da crônica era “O conde e o passarinho”, o que insinua a sábia e precoce opção do futuro sabiá da crônica.
Pois, mal comparando, muito cedo também decidi que, não importavam as circunstâncias, eu não queria ser príncipe. Preferia continuar plebeu. Pude tomar essa decisão em tenra infância porque, no mesmo ano que eu, só que alguns meses depois, nasceu o Príncipe Charles, filho da Rainha Elizabeth II.
Charles fez 60 anos, em novembro último. Eu já tinha feito, em fevereiro. Esses nove meses de diferença foram suficientes para que eu, um pouco mais velho, pudesse passar a vida acompanhando-o criticamente. De certa forma, crescemos juntos, embora de pais e de países diferentes, e nunca nos vimos, nem sentimos a menor falta disto. A distância, no entanto, não impediu que eu soubesse das suas peripécias porque, sendo Charles filho de rainha (e logo da rainha da Inglaterra), era natural que a imprensa lhe desse toda a cobertura. Da primeira à última chupeta de Charles, nada ficou sem registrar. E, pelo que tenho observado nesses 60 anos, acho que fiz a escolha certa. Principalmente porque eu tinha escolha, e ele, não.
Que história é essa de escolha? Você dirá que ninguém se torna príncipe por querer, donde eu não teria a menor chance de ser um, mesmo que quisesse. Mas aí é que você se engana: o mundo está cheio de tronos marca-barbante, principalmente na África, e qualquer brasileirinho com algum espírito aventureiro pode muito bem se aproximar de uma herdeira encalhada, jogar um charme em cima dela e tornar-se príncipe-consorte ou coisa que o valha. E marido de princesa, príncipe é, não importa que o pai dele tenha sido um vendedor de pentes na esquina, jornalista ou vereador. Do que concluo que não é uma tarefa impossível. A mão-de-obra necessária para concretizá-la, esta, sim, é que deve desanimar os mais ambiciosos. E, como nunca tive ambição, deixei as princesas encalhadas em paz e resolvi concentrar-me nas plebeias, do que até hoje não me arrependi.
Mas, como eu ia dizendo, Charles nunca teve escolha. Nasceu príncipe e escalado para ser rei, assim que a rainha sua mãe desocupasse o trono. Na qualidade de alguém que um dia seria rei, deve ter tido uma educação de primeira, e é a única coisa que sempre invejei nele. Estudou em colégios muito melhores do que eu e provavelmente teve os redatores da “Encyclopaedia Britanica” como seus tutores particulares. Mas nunca invejei as aulas de etiqueta a que também foi submetido, o que deve tê-lo obrigado a beber muita lavanda para não vexar um convidado que tivesse cometido essa gafe. Nunca invejei também sua obrigatoriedade de aprender a jogar pólo, de pigarrear antes de sorrir e, menos ainda, a de ter de usar saiote xadrez nos feriados ingleses. O fato é que, enquanto Charles sofria com tanta noblesse oblige, eu podia correr pelas ruas, matar aula, beijar as primas na escada de serviço, jogar pelada, esfolar o joelho e cavoucar o nariz sem dar satisfações a
ninguém.
Nunca o invejei sequer pelas garotas lindas com quem ele deve ter convivido em adolescente nos jardins do Palácio de Buckingham. Imagino os milhares de oferecimentos que não recebeu de meninas rosadas e de tranças louras, que mães ambiciosas tentaram empurrar para o futuro rei da Inglaterra. O garoto Charles, se quisesse, poderia ter se esbaldado de beijos e de outros pequenos prazeres atrás da abadia. Mas, pelo visto, a etiqueta ou o que for proibiu-o de esbaldar-se, e temo que Charles tenha sido um rapaz inexperiente, carente e torturado. Senão, por que trocaria a jovem, fresca, linda e trágica Diana, com quem se casou, por aquele simpático jaburu maternal, Camila
Parker-Bowles, que parece ter sido sempre a sua verdadeira paixão?
Vejo Charles envelhecendo e olho para mim mesmo no espelho. Mais grisalho e digno, ele está melhor hoje do que aos 50 anos, quando andou pagando uns micos históricos, inclusive aquele de que o mundo inteiro ficou sabendo: que ele gostaria de ser o modess de Camila. Sim, Charles agora parece bem, mais tranquilo. Mas ainda aparenta mais que os nossos 60 anos. É um homem triste. Já deve estar farto de ser príncipe, ainda mais porque o prometido trono não chega nunca.
Bem, o meu não vai chegar mesmo, e não me fará falta. A vida e o mundo não me devem nada. Também estou mais grisalho, só não sei se tão digno. Está tudo ótimo aqui na senzala e devo ser um dos mais felizes entre os homens comuns. E aposto que Charles também preferia ser um homem comum.
• Ruy Castro é escritor