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CAPA

PONTO DE PARTIDA (SM pág. 1)
Em Editorial, Henrique Carlos Gonçalves enfatiza a importância de realizar um amplo debate para atualização do Código de Ética Médica


ENTREVISTA (SM pág. 4)
Acompanhe entrevista com psicanalista e escritor...


CRÔNICA (SM pág. 10)
O cronista Tutty Vasques, convidado desta edição, nos brinda com texto inteligente e - como sempre - muito bem humorado


CONJUNTURA (SM pág. 12)
Dados sobre asfixia perinatal durante a última década mostram que esta foi a causa de morte em 23% dos óbitos neonatais no Brasil


HISTÓRIA DA MEDICINA (SM pág. 16)
O coração sempre ocupou papel de grande importância no simbolismo relacionado ao homem


DEBATE (SM pág. 20)
Na pauta das discussões, a (necessária e inadiável) revisão do Código de Ética Médica


EM FOCO
Saúde feminina é mais suscetível ao alcoolismo e sedentarismo, segundo importantes indicadores de saúde


HOMENAGEM
É preciso lembrar o médico nefrologista que marcou, com coragem e idealismo, a história do movimento médico no país


LIVRO DE CABECEIRA (SM pág. 33)
O destaque desta edição é, de fato, imperdível: A Verdade Sobre os Laboratórios Farmacêuticos, de Márcia Angell


CULTURA (SM pág. 34)
Acompanhe uma análise do simbolismo das telas de René Magritte, realizada pelo psiquiatra e psicanalista Carlos Amadeu Byington


HOBBY DE MÉDICO (SM pág. 38)
Acredite: ortopedista utiliza filadores externos para produzir peças pra lá de curiosas...


TURISMO (SM pág. 40)
Se você nunca ouviu falar no Atacama, este é o momento de arrumar as malas em direção ao... Chile!


CARTAS & NOTAS (SM pág. 47)
Todas as referências bibliográficas das matérias desta Edição você encontra aqui


POESIA
O Fogo e a Fé, poesia de Fátima Barbosa, fecha, com emoção, as matérias deste número


GALERIA DE FOTOS


Edição 44 - Julho/Agosto/Setembro de 2008

CULTURA (SM pág. 34)

Acompanhe uma análise do simbolismo das telas de René Magritte, realizada pelo psiquiatra e psicanalista Carlos Amadeu Byington

O universo misterioso de Magritte


A Filosofia no Quarto (Óleo sobre Tela - Coleção privada)

René Magritte desenvolveu uma variante solitária do surrealismo, embora torcesse o nariz à sua inclusão nesse movimento

Inicialmente, foi muito influenciado por Giorgio De Chirico (1888-1978), pintor italiano de origem grega que criou a escola de pintura metafísica. Assim como este, Magritte deixa escassos elementos no campo do quadro. Posteriormente, fez breves incursões pela vertente impressionista e fauvista até chegar à singular combinação poética de figuras absurdas – com freqüente reverência à escultura clássica –, criando uma representação realista e irreal ao mesmo tempo.


René Magritte

Nascido na Bélgica em 1898 e formado pela Academia de Belas Artes de Bruxelas, Magritte passou uma temporada em Paris, onde conheceu os pais do manifesto surrealista André Breton e Paul Éluard. A pintura em óleo fino e liquado, que criava uma estética “limpa”, tanto conferiu autenticidade ao trabalho de Magritte quanto comprometeu seu reconhecimento como um grande pintor. Não era ali que residia a sua genialidade. “Não importa tanto como ele pinta, mas o que pinta”, observou o filósofo, professor e escritor espanhol, Frederico Revilla, autor de centenas de ensaios e livros, entre eles a Bibliografia especializada em Historia del Arte y de la Cultura. “A pintura de Magritte é dotada de grande precisão técnica, na qual o naturalismo das representações contrasta com o simbolismo”.


O Espelho Falso (Óleo sobre tela, 53x78 cm - Museu de Arte Moderna de NY) 

Na sua perspectiva – opina Revilla – uma camisola, um par de sapatos ou uma jaula jamais parecem banais, embora o sejam como objetos isolados. O professor esmiúça mais exemplos e recorre à imagem do cavalo que avança “entre, por, sobre e contra” os troncos das árvores em Assinatura em Branco; as pontas dos sapatos que se transformam em dedos dos pés em Modelo Vermelho; e a paisagem que escapa do marco da pintura em A condição humana, entre outros.


A despeito do simbolismo, Magritte proclamava a sua obsessão pelo mistério. “Para mim, meus quadros são válidos quando resistem a interpretações em torno de símbolos ou outras explicações”. Revilla questiona como pode o espectador resistir à poderosa referência ao erotismo diante de um armário feio e simples com uma camisola que se metamorfoseia em seios femininos? E se não seriam pseudofantasmas aquelas cabeças cobertas por lenços, ilhadas de tudo e despersonalizadas? O pintor insistia em desorientar quem tentasse explicar a sua pintura por esse caminho:

O Filho do Homem
(Óleo sobre tela, 114x89 cm. Coleção H. Torczyner, NY)

“Não tenho nada a expressar! Busco simplesmente umas imagens e invento, invento... Não tenho que me preocupar com a idéia. Apenas com a imagem, a imagem inexplicável e misteriosa, porque tudo é mistério em nossa vida...”.

“Prescindo totalmente de acreditar na necessidade de uma atividade inconsciente. A seriedade dos especialistas do inconsciente me parece cômica”.

“A psicanálise é um sistema muito inteligente. Porém, não é mais que uma interpretação, entre outras, que atribui um valor de símbolo às coisas representadas, aos objetos escolhidos pelo artista. Mas para mim uma nuvem no quadro não é mais que uma nuvem. Não acredito no inconsciente, nem que o mundo se apresente a nós como um sonho de outro modo que enquanto dormimos. Não acredito em sonho acordado. Também não acredito na imaginação. Ela é arbitrária, enquanto eu busco a verdade; e a verdade é o mistério. Enfim, não acredito nas ‘idéias’, se eu as tivesse, meus quadros seriam simbólicos. Pois bem, eu afirmo que não o são”.

“Os símbolos são meus demônios; supõe-se que representam à realidade, mas o certo é que não representam nada”.

Magritte rejeitou o simbolismo representativo a ponto de atribuir nomes alheios às figuras pintadas. Com freqüência suas representações apresentam-se como discordâncias dos títulos. Um relógio foi intitulado O vento e, abaixo de um solitário cachimbo, foram grafadas em óleo a frase Ceci n´est pas une pipe (Isto não é um cachimbo).


Os Amantes (Museu de Arte Moderna de NY)

Magritte morreu de câncer de cólon, em 1967, aos 69 anos, insistindo no convencionalismo de sua pintura, na qual apenas havia lugar para o mistério e negando a inexorável simbologia que há nela. Nada mais subjetivo do que o mistério a estimular a imaginação.

Atendendo a pedido da Ser Médico, o psiquiatra e psicanalista
Carlos Amadeu Botelho Byington
fez uma análise do simbolismo na obra de Magritte que apresentamos a seguir: 

Uma interpretação simbólica junguiana da obra de Magritte

Carlos Amadeu Botelho Byington*

Mesmo que René Magritte não o tenha percebido, todas as situações que vivenciamos têm incontáveis significados que as tornam símbolos estruturantes da consciência. Os cem bilhões de neurônios que compõem o cérebro articulam a elaboração dos símbolos junto com a memória e tornam as pessoas capazes de uma inteligência extraordinariamente criativa dentro do ecossistema. Os indivíduos mais criativos no seu grupo social elaboram os símbolos e deles extraem significados dos quais se beneficiarão os membros de sua comunidade. A cultura amealha esses significados e os transmite para as gerações seguintes, na transformação constante da consciência. A ciência e a arte empreendem essa elaboração dos símbolos de forma exuberante e produtiva.


Buscando o Impossível (Óleo sobre tela, 105x81 cm. Coleção privada)

A ciência os elabora racionalmente, a partir da separação entre sujeito e objeto, como preconizou Descartes. A arte faz essa elaboração irracionalmente, por meio da reunião e até da superposição do sujeito e do objeto na imaginação. Assim, a ciência leva ao conhecimento do Outro e do Eu de maneira discriminada, enquanto a arte conduz ao conhecimento da vida reunindo o Eu e o Outro. O pensamento científico, por meio de idéias, isto é, da razão, abstrai padrões de relacionamento entre o Eu e as coisas que podem ser expressas por equações matemáticas, que representam as leis do conhecimento. O pensamento artístico opera através de imagens irracionais que abrangem o relacionamento do Eu e das coisas de maneira mágico-mítica. Olhamos no microscópio para contar nossos glóbulos vermelhos e saber se estamos ou não anêmicos. Examinamos uma pintura ou recitamos um poema para vivenciar mais profundamente nossa maneira de ser.


A Condição Humana I (Óleo sobre tela, 99x78 cm. Coleção C. Spaak, França)

Nesse sentido, a arte e a ciência se transformam em caminhos fecundos da busca do conhecimento e da vivência de ser. Durante seu trajeto secular, desde Giotto, no século XIII, até a arte pós-moderna do século XXI, a pintura ocidental teve sua grande crise no século XIX, quando descobriu que sua essência não era a reprodução do real, mas sim a percepção reveladora da dialética entre o sujeito e o objeto dentro da imaginação.

Ao sair do ateliê em busca da vivência da natureza, da relatividade da luz e da simplicidade da vida quotidiana, na segunda metade do século XIX, o impressionismo abriu caminho para as artes plásticas pesquisarem a essência da criatividade e o significado da percepção visual da vida.


O Castelo dos Pirineus (Óleo sobre tela, 200x139 cm. Coleção H. Torczyner, NY) 

No início do século XX, descobriu-se que toda e qualquer cultura expressa as artes plásticas e que o artista precisa de liberdade, diante das convenções, para criar as variantes da relação dialética entre o Eu e o Outro. A contestação das tradições representadas pelos valores da sociedade burguesa, a descoberta dos processos inconscientes e a revolução socialista inspiraram o manifesto surrealista proclamado por André Breton em 1924. Tratava-se da busca de uma supra-realidade que englobasse dentro da imaginação o subjetivo e o objetivo, o inconsciente e o consciente, incluindo os sonhos. Para isso, era necessário primeiro romper com todas as categorias existenciais que subordinavam a imaginação à tirania do objeto e que caracterizavam a tradição cultural ocidental. Esta ideologia tornou-se freqüentemente muito agressiva e radical, e, às vezes, jocosa e irreverente.

A obra de René Magritte emerge dominantemente do surrealismo. Mais do que um artista, ele declarou-se e pode ser considerado um pensador da imagem. Dedicou-se a uma pesquisa minuciosa, profunda e abrangente do que é a sensação visual inerente às artes plásticas para buscar vivenciar e expressar o mistério da vida no universo.

Acima de tudo, Magritte buscou romper com o domínio do objeto sobre o sujeito junto com qualquer tentativa de explicar qualquer coisa. A revelação do mistério se faz por uma linguagem que associa imagens e que produz um insight. Não pela causalidade ou por qualquer explicação, mas, como diria Jung, pela sincronicidade absolutamente única e irracional.

Assim sendo, a pintura se torna uma realidade metafísica que transcende o mundo fenomênico. Como alguém dotado de uma profunda intuição para buscar a verdade, Magritte achava que as coisas estão encobertas por aquilo que mostram. Assim, procurar um significado racional na pintura é fugir da vivência da sua revelação.

As “pesquisas” de Magritte abordaram temas que se repetem em muitos quadros relacionados entre si, como o homem do chapéu de coco, as representações separadas e reagrupadas do corpo humano, o uso das palavras junto com imagens de significados diferentes, a reunião de objetos impossíveis de se relacionarem normalmente, e muitos outros. Um dos temas centrais da obra é o estudo do fenômeno da representação e da realidade, presente em pinturas que incluem um quadro dentro de uma paisagem pintada.

Ao contrário de muitos surrealistas, Magritte não exercitava a agressividade ou o choque traumático do inesperado, mas procurava expressar sua filosofia de forma muito suave, empregando coisas e situações corriqueiras para revelar a visão do mundo transcendente pelo qual viveu fascinado e que estava convencido de que somente a arte plástica pode propiciar. Ele ocupou sua vida artística com a preocupação constante de nos transmitir a inteligência da imagem irracional para se compreender o Ser. Da mesma forma que os grandes mestres do Budismo Zen, ele desarma nossa mente, que vive no conhecimento ilusório da razão, para alcançar a transcendência das aparências e a percepção do absoluto. Suas imagens são koans. Por isso, recomendo aos colegas que não olhem de passagem para as pinturas de Magritte, mas fixem nelas sua atenção até receberem a mensagem que transmitem. 


* Carlos Amadeu Botelho Byington é psiquiatra e analista junguiano, graduado pelo Instituto Jung, em Zurique, foi presidente e diretor de ensino da Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica, sendo atualmente o coordenador de seminários da instituição.



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