CAPA
EDITORIAL
Destaque p/reportagem especial sobre o longo e penoso processo de aposentadoria dos médicos
ENTREVISTA
Nesta edição, Giovanni Guido Cerri fala sobre sua experiência à frente da FMUSP
CRÔNICA
O escritor Ruy Castro nos brinda com seu texto divertido e inteligente, sua marca registrada
SINTONIA
Polêmico, o apelo ao consumo infantil desenfreado na análise de uma especialista no tema...
MEIO AMBIENTE
Mata Atlântica: ainda é possível, sim, salvar o que resta desta floresta
CONJUNTURA
Aposentadoria: depois de anos de (árduo) trabalho, chega - enfim - a dificuldade maior...
DEBATE
Saúde Suplementar: especialistas no assunto avaliam as relações de mercado e a assistência à saúde
HISTÓRIA DA MEDICINA
Você conhece Alcméon de Crotona? Acompanhe a história do avô da Medicina, por José Marques Filho
ESPECIAL CENTRO DE SÃO PAULO 1
A restauração do centro da cidade devolve aos paulistanos a nostalgia dos bons tempos...
ESPECIAL CENTRO DE SÃO PAULO 2
Mercado Municipal: restauro tornou local agradável para passear, fazer compras e almoçar
ESPECIAL CENTRO DE SÃO PAULO 3
Theatro São Pedro aniversaria em plena atividade, com espetáculos de dança, música e dramaturgia
TURISMO
Prepare-se para realizar uma viagem de sonho pelo continente australiano
LIVRO DE CABECEIRA
Cartas da Guerra, de Antonio Lobo Antunes, é a recomendação de nosso delegado em Atibaia
CARTAS & NOTAS
Acompanhe o que os leitores da Ser Médico acham da revista...
POESIA
A poesia da vez é de autoria de Vladimir Mayakoviski
GALERIA DE FOTOS
CONJUNTURA
Aposentadoria: depois de anos de (árduo) trabalho, chega - enfim - a dificuldade maior...
Médicos versus “aposentadoria especial” do INSS
Profissionais da medicina correm risco de morrer de velhice antes de obter benefício previsto em lei
Antonio Carlos Gândara Martins*
“Direitos do cidadão, dever do Estado”. Estimulados por essa frase feita governamental, os médicos, profissionais que fazem jus a uma sobrecontagem de 40% (para homens) e 20% (para mulheres) sobre o tempo trabalhado até 28 de abril de 1995, pleiteiam suas aposentadorias junto ao Instituto Nacional de Previdência Social (INSS). A vantagem é assegurada pelo Decreto 4.827 de 2003, assinado pelo presidente da República e pelo então ministro da Previdência Social, Ricardo Berzoini. Nesse contexto, inserem-se todos os profissionais formados em 1978 e que começaram a trabalhar em seguida, completando 35 anos de serviço em julho de 2007. E, claro, todos os formados antes de 1978 já contam com mais de 35 anos, podendo requerer o benefício independentemente do fator idade.
Na prática, porém, raríssimos são os funcionários – é necessário aqui desvincular a instituição INSS de seus funcionários – que aplicam essa legislação. Em geral enquadram tais atividades como função e não profissão, conforme estabelece o decreto. Traduzindo em miúdos, o funcionário não aceita como prova de atividade o ISS (Imposto sobre Serviços), documento extensivo e obrigatório a qualquer segurado autônomo, para o qual não se justifica qualquer dúvida sobre sua legitimidade. Em seu lugar, passam a exigir fichas clínicas (sua exibição fere o sigilo da relação médico-paciente), impostos de renda (o contribuinte obriga-se a conservá-los por no máximo cinco anos) e declaração de cirurgias por hospitais (nem todas as especialidades são ligadas à cirurgia e a verificação da autenticidade da declaração é feita por fiscais do INSS, no hospital declarante, cujo tempo para cumprimento dessa diligência, é “a perder de vista”) ou atestados de óbito (não são todas as especialidades que emitem atestados de óbito).
Enfim, quando o enquadramento passa a ser por função e não por profissão exige-se uma infinidade de documentos outros, o que é expressamente vedado pelo próprio decreto ao determinar de forma imperativa: “A caracterização e a comprovação do tempo de atividade especial obedecerão à legislação em vigor na época da prestação do serviço”.
Ora, até 28 de abril de 1995, a Consolidação dos Atos Normativos sobre Benefícios (Cansb) – a então “Bíblia” de benefícios do INSS – que sempre enquadrou tais segurados por profissão, consagra o ISS como prova plena de serviço e, na sua falta, outros, em caráter substitutivo. Mas os funcionários do INSS, por ignorância, desconhecimento, de forma intencional, ou por terem recebido “instruções” a respeito, não tomam conhecimento da existência desse imposto e exigem uma infinidade de documentos, quando então, percebendo ou não, procedem a um enquadramento por função e não por profissão, afrontando a essência do Decreto 4.827.
Por conseqüência, criam obstáculos muitas vezes intransponíveis para a concessão do benefício! Abrem-se “as portas do inferno” para esse segurado e de forma artificiosa, quando da formalização do indeferimento, o INSS emite um documento, mas nele fazendo citar uma legislação diferente à editada na Cansb, com o claro propósito de confundir e induzir o segurado, dificultando a posterior apreciação pela Justiça Federal, se o caso concreto lhe for apresentado. Pouquíssimos são os que sabem disso e milhares os que hoje amargam processos, que se arrastam nas juntas e no Conselho de Recursos da Previdência Social.
Em 1981, o então INPS fechou “por motivo de economia” a sua modelar Escola de Funcionários. De lá para cá, em virtude dessa absurda medida, a legislação aplicável a benefícios no INSS... “é aquilo que está na cabeça” do funcionário, o qual, no seu poder discricionário, é limitado para conceder um benefício, mas ilimitado para negá-lo. E, pior, seu indeferimento dá margem a um recurso na Junta de Recursos da Previdência Social, onde a tramitação média é de quatro anos. Caso o segurado ganhe, o INSS recorre como expediente meramente protelatório, remetendo-o para uma instância superior – o Conselho de Recursos da Previdência Social, em Brasília – onde a tramitação média também é de quatro anos. E, se o segurado ganhar, o valor até então acumulado de atrasados será remetido à auditoria, para efeito de posterior liberação, cuja demora é de três a cinco anos! Acredite se quiser!
O médico que hoje percorrer dez agências diferentes do INSS em busca de informações sobre o tipo de benefício em apreço, delas sairá com 11 informações, todas distintas. A lei do INSS aplicável à matéria, assinada pelo presidente da República e pelo ministro da Previdência Social, é única, não dá margem a qualquer outra interpretação e está em pleno vigor, mas sua “aplicação”... depende daquele simples funcionário, muitos deles denominados “atendentes”, cujo poder discricionário, em 1ª instância, identifica-se com o de um ministro do Supremo Tribunal Federal – em última!
Recorrer à Justiça Federal, perante esse acéfalo estado de coisas é o que primeiro vem à mente de um segurado do INSS, mas aquilo que ele teria por objeto – fazer prevalecer seu direito e abreviar a tramitação do processo – pode ser uma segunda armadilha, cor amarelo esperança, pois qualquer decisão emanada de um juiz de 1ª instância, contra qualquer entidade governamental, sujeita-se a um duplo grau de jurisdição. Ou seja, para que a sentença seja cumprida, deverá ser submetida e ratificada por um Tribunal Regional Federal. O tempo de tramitação entre essas duas instâncias, poderá levar cinco anos ou mais, sem prejuízo de posterior remessa do processo, pelo INSS, à sua auditoria, para efeito de liberação dos valores acumulados, conforme descrito anteriormente, elevando essa demora para mais de dez anos.
Fazer o quê? Eis a questão. Não se trata aqui de ser alarmista, derrotista ou pessimista, mas acima de tudo realista, posto que essa é a mais pura realidade desconhecida aos olhos dos profissionais, iludidos e induzidos por essa bazófia conhecida por “direitos do cidadão, dever do Estado”, até o momento em que ainda não cruzarem as portas de uma agência do INSS. Protocolar um pedido de aposentadoria dessa natureza, no INSS, é muito fácil: a questão é o depois. É recomendável a quem tenha direito de se beneficiar dessa sobrecontagem e queira recorrer a um profissional do Direito, que escolha os que têm experiência nessa área e que o assunto seja amplamente discutido antes da entrada do processo. Caso queira tratar sozinho de tal processo, é aconselhável garimpar em qual agência da Previdência Social – muito embora isto seja por demais surreal, tanto quanto verdadeiro – a legislação aplicável é realmente aplicada e... boa sorte.
Este é o país em que vivemos!
* Antonio Carlos Gândara Martins é advogado, membro do Instituto dos Advogados Previdenciários (IAPE).
O Cremesp encaminhou o artigo à Assessoria de Comunicação do Ministério da Previdência Social, em Brasília, que não se manifestou até o fechamento desta edição.