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Nesta edição, uma entrevista, inteligente e informal, com o bibliófilo José Mindlin


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José Ephim Mindlin: inteligência, lucidez e bom humor numa entrevista surpreendente!


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Crônica de Artur Xexéu: Dr. Kildare versus Dr. Casey... Você lembra desses seriados médicos?


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Estado do Amazonas: as comunidades indígenas e o (difícil) acesso à saúde


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A difícil rotina dos médicos intensivistas em UTI pediátrica é tema de tese de doutorado


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Veja o que diz Lynn Silver, subsecretária de Saúde de NY, sobre o sistema de saúde norte-americano


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Debate sobre Custos e Qualidade no atendimento à saúde reúne Cremesp, HSL e Unimed


HOMENAGEM AO DIA DA MULHER
Texto de Isac Jorge Fº, rico em detalhes, traz a triste história das mulheres ditas "feiticeiras"...


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Prepare-se para sentar-se à mesa e saborear duas receitas simples, mas deliciosas!


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Acredite: médico e artista cria nova técnica de pintura a partir da expressão de rabiscos


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Edição 38 - Janeiro/Fevereiro/Março de 2007

DEBATE

Debate sobre Custos e Qualidade no atendimento à saúde reúne Cremesp, HSL e Unimed


A relação entre custos e a qualidade da assistência médica


Da esq. para a dir.: Ciro Monteiro, Antonio Pereira Fº, Desiré Callegari e Raul Cutait

Cremesp reúne profissionais do Sírio Libanês e da Federação das Unimeds para discutir o impacto dos preços de materiais médicos no atendimento à saúde

Até a primeira metade do século passado, o custo da assistência médica era relativamente barato, com os recursos diagnósticos basicamente reduzidos às análises clínicas, raios-X e ultra-som. Depois disso, a medicina passou a viver sob o boom da alta tecnologia em saúde em praticamente todas as especialidades – continuamente superado por recursos ainda mais sofisticados e medicamentos de última geração. Essa mudança tem alto impacto no custo da assistência, seja no sistema público ou privado. Há dificuldades para equacionar os custos crescentes da assistência médica com garantia de atendimento adequado, problema que pode interferir nos direitos do paciente e na autonomia do médico.

Mas, há outras questões conflituosas. Quem paga a conta diz que os médicos não sabem lidar com custos. Os médicos dizem que quem paga a conta privilegia a alta tecnologia mas isso não resulta no melhor para pacientes. Estas e outras questões foram temas de discussão deste debate, que teve como convidados os médicos
Raul Cutait, diretor geral do Setor de Oncologia do Hospital Sírio Libanês, e Ciro da Silva Monteiro, diretor de marketing da Federação das Unimeds do Estado de São Paulo.

O encontro foi coordenado pelo conselheiro e diretor de Comunicação do Cremesp, Antonio Pereira Filho e contou com a participação do presidente da Casa, Desiré Callegari.

Antonio Pereira Filho: Em escala mundial, uma das questões de maior impacto na autonomia do médico atualmente é o sistema pagador, seja ele público ou privado. No sistema público, são estabelecidos pacotes de assistência em que o profissional deve adequar-se a ele, sem levar em conta, necessariamente, as particularidades de um grupo de pacientes. As operadoras também impõem limitações aos médicos. Inicialmente, gostaria de saber qual a reflexão que os senhores fazem desse problema.

Cutait: A assistência médica vive do binômio qualidade e custos. Antigamente se falava na busca da qualidade sem pensar em custos. Hoje, falamos em custos pensando em como adaptá-los à qualidade. É um sistema um pouco perverso porque é mais legítimo para com aquele que paga a conta do que com o paciente. Nos últimos 15 ou 20 anos, a inflação subiu no país em ritmo moderado (em torno de 40%), enquanto o custo da assistência médica aumentou 200% devido à constante incorporação de tecnologias de ponta, novos medicamentos, órteses e próteses cada vez mais caros. E como as pessoas vivem mais tempo, as doenças crônicas e associadas ao envelhecimento consomem maior quantidade de recursos disponibilizados, tanto no setor público como no privado. Há um conflito entre o que se pode gastar no coletivo e individualmente. A saída é melhorar a padronização de condutas e os protocolos de atendimento para que se ofereça o que é desejável, além da evolução dos processos administrativos para que os custos possam ser trabalhados de forma mais racional. Hoje isso está muito solto, só as modernas visões de gestão de recursos poderão fazer com que o binômio qualidade e custos seja melhor trabalhado. Um exemplo banal é um paciente com refluxo gastroesofágico receber um medicamento de última geração – o melhor de todos, que custa muito mais do que um genérico da geração anterior – capaz de resolver o problema em até 90% dos casos. Até onde temos que deixar aberta a porta para o médico prescrever exatamente o que acha que é o melhor? Talvez, se o melhor para 90% é muito mais barato, vamos usar este. E podemos passar ao passo seguinte para os casos que não se resolveram.

Callegari: Os protocolos, porém, são diferentes no Brasil e num país rico e desenvolvido. Qual é o peso dessa diferença para nós, profissionais da saúde, conscientes de que existem mais disponibilidades em certas regiões do mundo do que em outras? Isso nos preocupa. No contexto em que vivemos, com a televisão e a Internet trazendo informações sobre medicamentos e procedimentos médicos de última geração, o conhecimento das melhores terapêuticas inclusive motiva a busca de garantia de tratamento mais avançado por meio de medidas judiciais. Como o médico deve se situar nesse contexto?

Cutait: Há situações em que o médico precisa de um respaldo para que possa tomar a melhor decisão, inclusive discutir sobre como poderíamos colaborar para criar um projeto que ajude o médico a exercer plenamente a medicina. Às vezes um ultra-som resolve, então por que o médico pede uma tomografia? Ou o inverso, ele precisa de uma tomografia, mas o hospital não tem ou o plano de saúde não autoriza o procedimento. O médico precisa estar mais respaldado dentro do atendimento que pode dar. O protocolo padronizado dá ao profissional a possibilidade de decidir dentro das circunstâncias, mas tira sua liberdade plena, que também não é desejável dentro das atuais circunstâncias. A medicina mudou, saímos da fase dos “achismos” e entramos na fase da medicina baseada em evidências.

Callegari: É possível definir como seria o nosso atendimento médico padronizado? Baseado em quais padrões, de que países, em quais evidências científicas? O médico prescreve um medicamento ao seu paciente, que recorre à justiça para obtê-lo junto ao setor público. Depois, o setor público questiona a prescrição por via judicial, porque o medicamento, embora seja usado nos EUA como o mais avançado e adequado a determinados casos, ainda não foi normatizado pela Anvisa. Esta globalização trouxe problemas para o exercício da medicina.

Monteiro: A questão dos materiais e medicamentos é a que mais nos aflige atualmente. Na medicina, as novas tecnologias são cumulativas e não suprimem custos como na indústria em geral. A radiografia não substitui a tomografia, só agrega um custo. Vivemos uma cadeia negocial complexa. A partir do momento em que somos classificados como operadoras de planos de saúde, a equação se complica. As Unimeds foram criadas há 40 anos e tinham uma estrutura financeira completamente diversa da atual. O princípio de criação da cooperativa, de dar serviço digno ao médico e, de certa forma, uma remuneração adequada, continua sendo seu objetivo. Mas temos sofrido interferências, nos últimos tempos, sobre o que estamos obrigados a realizar. Surgiram liminares para garantir tratamentos solicitados por médicos. É também preciso lembrar que os recursos estão caindo, em parte pela regulamentação da Agência Nacional de Saúde (ANS) e em parte pelo mercado que nos obriga a praticar valores determinados.

Pereira: Parece que aqui há o consenso de que a situação dos honorários médicos tem relação direta com o gasto das operadoras com materiais e com a alta tecnologia. Ao longo dos anos os honorários médicos tiveram uma subida muito discreta, que não acompanhou a inflação, enquanto o custo dos materiais cresceu surpreendentemente. Acredito que um controle racional do uso de materiais poderia ser feito para que os honorários médicos não fiquem tão defasados da realidade.

Callegari: Alguns convênios utilizam os custos como moeda de troca, pratica-se algo como “se você não onerar muito o convênio, receberá um bônus”, o que é um absurdo...

Pereira: É preciso fazer alguma coisa no sentido de não permitir que os recursos sejam todos direcionados para o material, sem interferir na qualidade da assistência, claro.

Monteiro: Dos gastos de internação da Federação das Unimeds em 2006, 37,18% refere-se a materiais e medicamentos; 17% a honorários e 30% às diárias hospitalares e outras taxas. Em 2001, esse primeiro item representava 19% do total e já estávamos em uma época problemática.

Callegari: E quanto se gastava com honorários médicos na época?

Monteiro: Os gastos eram um pouco maiores. Eles diminuíram porque os outros tomaram espaço.

Cutait: Acredito que o raciocínio tem que ser o clássico: quanto é decente um médico ganhar? Não para ficar rico, pois há de se convir que a classe médica não é mais capaz de ganhar aquilo que talvez fosse até mais do que o correto. Mas, sim, para sair dessa fase de penúria daqueles profissionais que nem ao menos conseguem ir a congressos porque não têm recursos ou que trabalham de forma estafante. Os médicos representam o elo fraco da corrente. O erro está na equação; numa grande empresa o material custa “X”, mas se abaixar um pouquinho e somando um item com outro na hora de fechar o orçamento será possível melhorar essa equação. Mas como o atendimento passa pelos médicos, é obvio que também precisa ser reavaliado.

Pereira: Há uma relação temporal nítida entre o empobrecimento da classe médica e a implementação de tecnologias. Antigamente havia médicos ricos e hospitais pobres. A partir do momento que se passou a gastar com tecnologia e as estruturas hospitalares precisaram se modernizar, a classe médica começou a empobrecer.

Monteiro: A Federação das Unimeds criou, em março do ano passado, um núcleo de negociação de órtese, prótese e materiais especiais, que está funcionando bem. A partir desse momento, conseguimos um desconto médio de 40% pelo simples fato de negociar. Há muita gordura que precisa ser extirpada e muita gente ganhando dinheiro nesse mercado, enquanto o profissional que pratica a medicina com os ideais de Hipócrates vive essa situação. Numa tentativa e desejo de nos aproximar do Conselho e das demais entidades médicas, a Federação propõe uma união, capaz de mudar essa situação. Inclusive, acaba de sair uma resolução do Conselho Federal de Medicina, que é excelente, por reduzir o número de pessoas envolvidas no uso de implantes por um hospital.

Callegari: Trata-se da Resolução 1804 de novembro do ano passado que estabelece o seguinte: “todos os implantes terão seu uso sob a supervisão e responsabilidade do diretor técnico das instituições hospitalares, cuja autoridade poderá ser delegada a outro médico mediante expediente interno”. Na verdade, a resolução foi um pouco tímida, pois apenas transfere ao diretor técnico a responsabilidade pelos implantes. Mas é um bom começo. E, apesar de tímida, as pessoas que participaram dela sofreram ameaças.

Pereira: No âmbito da comercialização de materiais médicos, há problemas por todos os lados. As taxas são abusivas. Em meses de deflação as operadoras de saúde mantém as taxas de comercialização entre 10 e 30%, ninguém obtém esses índices em nenhuma aplicação financeira. Há um contaminante terrível nessa história que são as comissões que alguns especialistas recebem, principalmente os que manipulam materiais de alto custo como órteses e próteses. Embora não se consiga provar, esse componente existe.

Cutait: Às vezes ouvimos uma história ou outra de que o médico pode receber parte do lucro distribuidor, o que é absolutamente condenável. No começo da década de 80, quando começamos a fazer cirurgias mecânicas que permitiram melhorar alguns desses procedimentos, o valor do material que recebíamos era quase 10 vezes maior do que o praticado nos Estados Unidos, onde era fabricado. O governo poderia atuar de forma mais adequada para saber porque algo que custa “X” no local de origem chega aqui custando duas vezes “X”. Existe uma cadeia de lucro excessivo desde o fabricante até o distribuidor, passando pelo importador. Como o Brasil sempre vive uma expectativa de inflação e de que o dólar está baixo mais pode estourar, o pessoal joga o preço lá em cima e tenta trabalhar com os descontos. Mas, se o preço alto colar, tanto melhor. Há cerca de 10 anos iniciamos um esquema com sete ou oito hospitais para realizar compras conjuntas, quando então foi possível baixar o preço de forma considerável.

Monteiro: Há dois anos, quando era diretor administrativo da Federação no Vale da Paraíba, alguns hospitais da região cobravam taxas de comercialização de 38%. Depois de uma negociação, a maioria aceitou e pratica 10%. Embora esta ainda seja uma taxa exagerada, conseguimos conviver... já os 38%, são impraticáveis. Porém, o que me deixou estarrecido foi verificar que um produto é vendido pela mesma empresa a 12 mil reais no Rio de Janeiro, mas em São Paulo pode custar sete, 14 ou 17 mil reais e, no Espírito Santo, 8,5 mil reais. Não tem carga tributária, é venda direta para o hospital. Foram situações como essa que nos levaram a criar a central de negociação.

Pereira: Qual é a representatividade da carga tributária no custo da assistência médica?

Cutait: Uma parte importante do custo é a tributação, mas existem outros percentuais incorporados que são o lucro do importador, o lucro do distribuidor e o lucro do hospital. Ou seja, o material sofreu quatro sobretaxas. Quando o valor for apresentado às claras, mostrando o lucro do importador, distribuidor, entre outros, fica mais fácil estabelecer um certo patamar. Algumas coisas precisam ser resolvidas no âmbito do governo. Atualmente existe isenção fiscal para tantos produtos, por que não também para aquelas que podem fazer a diferença na assistência à saúde? Estas são algumas maneiras de racionalizar a cadeia de preços.

Monteiro: Em um simpósio realizado em 2006, fizemos uma mesa redonda com representantes da Unimed do Brasil, da Johnson & Johnson e da Amil para discutirmos essas dificuldades, que são de todos. Na ocasião, foi apresentada a proposta de realizar uma negociação direta para quebrar esta cadeia. Existe uma inclinação para este tipo de negociação, apesar das atuais dificuldades...

Pereira: Há uma resistência ao produto nacionalizado. É comum ouvir médico dizer “não opero com produto nacional”. A qualidade é tão diferente assim? Temos de caminhar para melhorar a qualidade dos produtos nacionais e de fabricar aqueles que ainda não são feitos no país? Ou precisamos que a classe médica confie no produto nacional?

Cutait: Há materiais que podem ser produzidos no Brasil, com qualidade. É preciso abrir espaço e criar incentivos para as empresas produzirem o que interessa ao consumo do brasileiro. Com isso talvez seja possível baratear os custos, mas de forma controlada e racional. Não podemos pensar que nacionalizar vai melhorar 100% a cadeia de negociação. Será que nossa mão de obra permite a prática de preços atrativos? Os EUA, por exemplo, não produzem nada em casa, a mão de obra utilizada é toda da Ásia. Mas existem coisas não feitas aqui e que não serão produzidas a longo prazo porque envolve uma tecnologia e uma linha de pesquisa que poucos centros produtores no mundo são capazes de disponibilizar. Temos que passar por essa cadeia de comercialização, não temos escolha.

Pereira: Quando se trata de produtos mais sofisticados, como um implante cardíaco, temos que trazer de fora. Mas em outros casos, como uma prótese ortopédica, que não exige tanta tecnologia para sua produção, não dá para dizer que o importado é muito diferente do que é feito no país...

Cutait: Nesse caso, as sociedades de especialidades poderiam participar da avaliação da qualidade desses materiais, atuando em ensaios clínicos. O mais importante e urgente é trabalhar bem esta cadeia de comercialização. Como trabalhamos mal, nos damos mal.

Monteiro: Gostaria de fazer um contraponto. A partir do momento que o material está registrado na Anvisa, ele tem a chancela do governo. E se um órgão chancelou aquele material, como um médico que às vezes não tem formação para fazer esse tipo de análise pode falar que o material não serve? Ele deveria rebater que não quer o produto e encaminhar uma denúncia para a Anvisa para que o mesmo seja retirado do mercado.

Cutait: Essas aprovações têm que ocorrer mesmo por solicitações. Mas, temos que trabalhar na cadeia de custos. Houve uma época que os antibióticos eram absurdamente caros, representando o quinto item de gasto dos hospitais. Os médicos não prescreviam de forma racional, mas sim porque o antibiótico mais atual era sempre o melhor.

Pereira: Em relação ao comportamento do médico, recentemente nos foi transmitido que, hoje, ¼ dos gastos das secretarias estaduais e municipais de saúde com medicamentos se devem às ações judiciais.

Cutait: Na minha área, de câncer de colo uterino, não usamos mais o 5-fluoracil, que era quase gratuito, na quimioterapia. Temos que usar cisplatina que é cara, além de duas ou três drogas que também custam muito. Mas a cisplatina não está disponível no SUS, somente o 5-fluoracil. Ou seja, a partir do momento que você não está tratando, está matando. Agora saiu uma vacina que custa um absurdo e para a qual os estudos ainda são preliminares, mas que representa um ganho quando somada a outros procedimentos como a cisplatina. Agora, do 5-fluoracil para cá a distância é grande. E da cisplatina para cá é um beneficio não justificável, talvez. Mas todos que entram na justiça para solicitar a vacina ganham.

Monteiro: A judicialização é um dos fatores de aumento de custo para nós, mas ultimamente temos um entendimento por parte de juízes um pouco menos deletérios do que num passado recente. A questão é procurar combater acordos fraudulentos entre alguns médicos e fornecedores, sem desrespeitar a grande maioria dos médicos que não têm esse tipo de conduta. Sou médico e defendo minha classe. A finalidade da cooperativa é buscar honorários dignos e oferecer o atendimento de saúde de qualidade às pessoas. É preciso investir mais em medicina preventiva para ter um pouco de folga no momento de gerenciar uma doença. Somente assim podemos impedir que as pessoas cheguem ao ponto crítico, quando tratamos de saúde. Também pretendemos estabelecer, a curto prazo, o encaminhamento da compra para câmara de negociação e partir daí para o leilão, o que exclui um dos atores do processo. O profissional que indicou um material não pode indicar o fornecedor, isso contraria a ética médica. Ele pode pedir determinado material com certas características desse fabricante, mas indicá-lo, como ocorre às vezes, é fraude.

Cutait: Tudo o que debatemos esbarra no atendimento à alta complexibilidade. Entretanto, os doentes são tratados basicamente por médicos de qualquer especialidade em determinadas cidades do país. Numa cidade pequena, seja lá qual for a doença com riscos e custos maiores, não seria melhor encaminhar o caso a um centro de referência? Esta é outra tecla que temos que bater. Quando houver necessidade de realizar procedimentos mais sofisticados, estes deveriam estar disponíveis em centros credenciados.

Pereira: As indústrias farmacêuticas e de equipamentos médicos, por sua vez, investem cada vez mais pesado em propaganda. Gostaria que os senhores comentassem o impacto da publicidade no custo da assistência médica. E, dentro desta publicidade, existe uma questão seríssima que é o financiamento de congressos e publicações científicas.

Cutait: No exterior, todos os médicos que ministram palestras em congressos são obrigados a elencar seus vínculos. Essa transparência é um avanço importante. Por outro lado, os laboratórios precisam fazer marketing para vender qualquer coisa. Existe um percentual mágico, em torno de 5% dos custos, para gastar em marketing. Não sou contra a propaganda. Onde eles vão fazer propaganda? Onde estão os médicos. E onde estão os médicos? Nos congressos. É impossível não visualizar o entrelaçamento entre gastos de marketing de grandes laboratórios com o que os médicos precisam, que é a promoção de seus eventos, congressos etc. Sem isso, esses encontros se tornariam inviáveis pelos custos. Mas os médicos precisam manter uma postura ética diante dos convites. Quando alguém me convida para uma palestra e fala que “o laboratório “X” está me convidando”, eu digo “não quero que o congresso me convide se é o laboratório “X” que vai pagar a passagem”, isso é problema de vocês. Posso dar a aula, mas quem deve pagar é o congresso. Também não admito que ofereçam passagem para minha esposa.

Monteiro: Concordo. Não há nada de espúrio em um eminente membro da academia participar e ajudar a desenvolver algum tipo de produto, desde que ele esteja convencido de que aquilo oferece um benefício e que está recebendo remuneração justa por isso. O que não pode existir é uma relação promíscua. A grande questão é a transparência.

Callegari: Sempre procuramos discutir e expor com clareza as questões que nos afligem em nossos veículos de comunicação. Este foi mais um debate profícuo nesse sentido. Gostaria de agradecer a presença dos senhores que, como sempre, contribuem para o desenvolvimento e a informação da classe médica.

Monteiro: Em nome da Federação, agradeço ao convite do Conselho, extremamente oportuno, pois a questão dos custos nos aflige sobremaneira. Acredito que numa ação conjunta podemos contornar esses problemas. Recentemente li uma frase que cai bem nesta conversa: “É preciso encorajar médicos a calcular custos tão bem quanto calculam os benefícios e encorajar os gerentes a calcular os benefícios tão bem quanto os custos”.

Cutait: Os tempos mudaram. Não é mais o médico quem comanda o espetáculo e sim quem paga a conta. Porém, é o médico que usa a caneta para decidir o que é melhor para cada paciente. O processo decisório é decorrente de uma somatória de variáveis que passam pelo conhecimento, pela postura ética, pela disponibilidade dos recursos. Devemos interferir na cadeia negocial. E talvez esse processo ganhe força se as entidades médicas como os CRMs e associações médicas, que hoje têm um destaque que não tinham no passado, se unam para criar um grupo de estudos capaz de gerar sugestões, além do simples diagnóstico. O importante no processo de criação não é só ter idéias, mas fazê-las acontecer. Precisamos incorporar soluções e apresentá-las para que as coisas possam acontecer. O pior erro é acreditar que o governo pode resolver. Devemos criar condições para que o governo possa tomar as decisões.

Pereira: Os materiais médicos estão impactando os custos de tal maneira que cerceia a liberdade do médico no momento que ele precisa escolher a terapêutica mais adequada. Mas é uma situação que pode ser mudada. E a saída não é uma só, temos que atuar em várias frentes. A criação de protocolos é uma saída, a prevenção é muito importante, as questões fiscais têm de ser reavaliadas e trabalhadas. Buscar incentivos governamentais para nacionalizar a fabricação de alguns produtos também é fator necessário e os aspectos comportamentais do médico devem ser discutidos. Agradeço a participação dos senhores e espero que este debate seja o começo de uma discussão para melhorar a qualidade do trabalho do médico e, conseqüentemente, da assistência aos pacientes.



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