CAPA
PONTO DE PARTIDA
Editorial de Isac Jorge Filho: Pequenas Mudanças
POESIA
Miguel Carlos Vitalino, escritor e médico pneumologista
ENTREVISTA
A psiquiatra Carmita Abdo é a convidada especial desta edição
CRÔNICA
Ser filho de médico - José Simão
SINTONIA
Gravidez na adolescência
CONJUNTURA
Medicina Esportiva
DEBATE
Reprodução assistida para portadores de HIV
MEIO AMBIENTE
Compostos químicos e a saúde
COM A PALAVRA
A inveja não é só ruim - Carlos Amadeu Botelho Byington
HOBBY DE MÉDICO
Xadrez - No tabuleiro do doutor
HISTÓRIA DA MEDICINA
Tempo de criação 1951-1956
TURISMO
São Luiz do Paraitinga - Histórica, caipira e festeira
CULTURA
Corpos Pintados: mostra já percorreu 32 museus do mundo
CARTAS & NOTAS
Novo projeto gráfico da sua revista
LIVRO DE CABECEIRA
A Viagem Vertical - Enrique Vila-Matas
GALERIA DE FOTOS
CRÔNICA
Ser filho de médico - José Simão
Ser filho de médico
“Sou viciado em bulas. Principalmente em reações adversas. Sinto todas”
*José Simão
Meu pai era médico, meu irmão é médico e eu sou hipocondríaco. O dia em que não tomo remédio algum, tomo um tylenol. Prá garantir! Crescer entre médicos é crescer ouvindo: espasmos, baixo ventre, tromboflebite, plasil, nádegas, injetável e me liga daqui três dias. E a pior coisa que podia acontecer com um hipocondríaco foi o que aconteceu comigo: ficar doente em Istambul! E ler as bulas em turco! Desespero total, a única palavra que entendia: tablets!
Sou viciado em bulas. Principalmente em reações adversas. Sinto todas! A mais preocupante, por causa do meu trabalho, é: diminuição da acuidade mental! E a melhor consulta que tive até hoje: “Doutor, toda vez que eu aperto aqui, dói”. “Então porque aperta?” respondeu o médico!
Meu pai era clínico geral das antigas, atendia doentes em casa. Esse é o meu sonho de consumo: ser atendido em casa. O apogeu do hipocondríaco! Quando ele ia ao hospital, eu ficava passeando com as freiras e comendo gelatina de hospital. Mas devo ter visto alguma coisa grave que apaguei da memória porque hoje não consigo entrar em hospital, tremo como vara verde e sinto que vou desmaiar! Quando atendia doentes na região da 25 de Março, me deixava no restaurante da dona Vitória, onde uma roda de libanesas vestidas de preto amassava quibe cru, e sempre sobrava pra mim. Talvez o quibe cru tenha me deixado tão forte!
O bom de ser filho de médico é se sentir a vontade no mundo dos remédios. O ruim é voce se achar capacitado para se automedicar e medicar os amigos. “Plasil não, é melhor tomar buscopan”. “Vagostesyl é muito fraco, toma logo um lexotan”. Eu sou do tempo do vagostesyl! E o pensamento básico do hipocondríaco quando um amigo ou parente de amigo está doente: se fulano está com isso, eu também estou. Se fulano teve aquilo, eu também tenho. E a hilária definição de urologista: “urologista é aquele que olha pro seu pingolim com desdém, pega com nojo e cobra como se tivesse chupado”. E para terminar tenho que confessar um coisa que realmente me envergonha: eu minto para os médicos!
* José Simão é colunista do jornal Folha de São Paulo