CAPA
EDITORIAL (JC pág. 2)
Temas polêmicos, abordados no Pré-Enem, serão pautas do encontro nacional em julho
ENTREVISTA (JC pág. 3)
Paulo Antônio de Carvalho Fortes, presidente da Sociedade Brasileira de Bioética
ATIVIDADES 1 (JC pág. 4)
Cremesp realiza módulo de atualização profissional no interior do Estado
PRÉ-ENEM (JC pág. 5)
Propostas aprovadas devem agora ser discutidas no evento nacional
GERAL 1 (JC pág. 6)
MEC notifica cursos de Medicina com avaliação insatisfatória no Enade
GERAL 2 (JC pág. 7)
Na Câmara dos Deputados, os honorários dos profissionais da saúde suplementar
ESPECIAL (JC págs, 8 e 9)
Atualizações do novo texto, aprovadas em agosto de 2009, estão vigentes desde abril
ATIVIDADES 2 (JC pág. 10)
Atualização profissional realizada pelo Cremesp contou com número de inscritos recorde
ATIVIDADES 3 (JC pág. 11)
Delegacia do Cremesp da Vila Mariana sedia evento sobre saúde mental
ÉTICA & BIOÉTICA (JC pág. 12)
Pacientes terminais necessitam de ações multiprofissionais com elevado conteúdo científico e humano
CFM (JC pág. 13)
Representantes do Estado no Conselho Federal se dirigem aos médicos e à sociedade
ALERTA ÉTICO (JC pág. 14)
Análises do Cremesp ajudam a prevenir falhas éticas causadas pela desinformação
GERAL 3 (JC pág. 15)
Eventos simultâneos debatem as atualizações do novo CEM
ESPECIALIDADE (JC pág, 16)
Mais de 20 mil médicos associados e mais de 14 áreas de atuação na especialidade. Em foco, a...
GALERIA DE FOTOS
ÉTICA & BIOÉTICA (JC pág. 12)
Pacientes terminais necessitam de ações multiprofissionais com elevado conteúdo científico e humano
CUIDADO PALIATIVO: UM DIREITO HUMANO
Clóvis Francisco Constantino*
Em 1900, a expectativa de vida nos EUA era, em média, de 46 anos de idade. No ano 2000, de 78. No que diz respeito às causas dos óbitos, o perfil epidemiológico evoluiu da seguinte forma: de infecções, acidentes e pós-partos para doenças cardiovasculares, câncer e demência.
A casa, inicialmente, era o local de morte mais frequente, mas no início do século 21, este passou a ser o ambiente hospitalar. O período de dependência dos pacientes em processo de morte – que era rara no começo do século 20, pois o desenlace ocorria em pouco tempo – passou a ser, em média, de quatro anos, a partir de 2000.
Ficam assim evidentes os dilemas éticos do “fim de vida” com que passamos a conviver: aumento da sobrevida, doenças crônicas incapacitantes, envelhecimento populacional (que desaguará num alto grau de dependência), necessidades múltiplas insatisfeitas, agudizações frequentes dos problemas crônicos e a própria evolução da doença, lenta e progressiva, mas irreversível.
A partir das décadas de 60 e 70, Cicely Sauders, no Reino Unido, e Elisabeth Kübler-Ross, nos EUA, começaram a chamar a atenção para a necessidade de oferecer cuidados rigorosos, científicos e de qualidade a um contingente cada vez mais numeroso de pessoas que, frequentemente, eram encaradas como doentes a quem já não havia nada a fazer.
O modelo que foi se aperfeiçoando tinha – e tem – por base a atenção integral (física, emocional, social e espiritual) centrada na pessoa e nos seus objetivos, mais do que na doença e nos objetivos da equipe, incorporando a família como um elemento a tratar.
Em meados dos anos 80, propõem-se, no Hemisfério Norte, os cuidados paliativos como um dos elementos do Sistema de Saúde. Contudo, o acesso às suas práticas rigorosas ainda é, hoje, bastante assimétrico, mesmo no ambiente europeu.
Conceitualmente, os cuidados paliativos têm, como objetivo central, o bem-estar e a qualidade de vida dos doentes, para o que se deve disponibilizar tudo o que vá ao encontro dessa finalidade, sem recorrer a medidas agressivas que não se direcionem a essa meta.
Os pontos fundamentais em cuidados paliativos são o controle dos sintomas, a comunicação adequada, o apoio à família e o trabalho em equipe.
Segundo o IBGE, pelo censo demográfico do ano 2000, em 1960 havia 2 milhões de idosos no Brasil; em 2000, eram 13 milhões, e a estimativa projetada para 2020 é de 26,3 milhões.
Observamos que a questão relacionada à assistência médica no fim da vida física é, cada vez mais, um problema de política de saúde pública, importando que o Estado implemente medidas que visem ao fomento de cuidados domiciliários ou institucionalizados de grande qualidade. Isso permitiria promover a generalização dos cuidados paliativos, incluindo estratégias efetivas de luta contra a dor – com o concurso de equipes multidisciplinares preparadas – e a definição progressiva e bem fundamentada de diretrizes regulatórias de práticas de suspensão ou abstenção de meios¬ desproporcionados de tratamento curativo.
É com grande satisfação que participamos da revisão do Código de Ética Médica, cujo texto introduziu em seus dispositivos a expressão “cuidados palia¬tivos”, por sugestão deste relator. Sem dúvida, um grande avanço que evidencia, aos médicos e à sociedade brasileira, o seu significado enquanto área de conhecimento, com mais de trinta anos de acúmulo de conceitos em ciências da saúde e atenção em várias partes do mundo.
O cuidado paliativo inclui ações multiprofissionais com elevado conteúdo científico e humano; os atos médicos que dele fazem parte têm adquirido tal envergadura que, certamente, um dia estarão em uma nova área de atuação da medicina brasileira: a Medicina Paliativa, restando para isso, além da vontade política, a criação oficial de centros de treinamento – Residência Médica – relacionados a determinadas especialidades médicas existentes.
Implementar os cuidados paliativos na saúde pública brasileira, com planejamento e responsabilidade, significará mais um enorme passo em direção à dignidade do ser humano, quem sabe, mais um direito humano a ser observado, de última geração.
Cuidados Paliativos no CEM
Capítulos que abordam a questão dos cuidados paliativos a pacientes terminais:
Capítulo 1 – Princípios Fundamentais
XXII - Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados.
Capítulo 5 - Relação com pacientes e familiares
É vedado ao médico:
Art. 41- Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal.
Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.
* Clóvis Francisco Constantino é conselheiro vice-corregedor do Cremesp, presidente do Departamento de Bioética da Sociedade Brasileira de Pediatria, presidente da Sociedade de Pediatria de São Paulo e doutorando em Bioética pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto-Portugal/CFM.
Opinião de Conselheiro
O “trote” e a responsabilidade ética dos futuros médicos
Isac Jorge Filho
É um espetáculo deprimente que se repete a cada vez que são divulgados os resultados dos vestibulares. Futuros médicos assumem papeis lamentáveis e recebem seus novos colegas com calorosas manifestações...de selvageria. O que devia ser momento de alegria pela recepção dos novos colegas se transforma em manifestação bestial de desamor ao próximo. As notícias resultantes dessa “recepção” frequentemente são trágicas: é o calouro que morreu afogado, é o outro que ficou cego, é o que sofreu trauma craniano, é o que teve queimaduras pelo corpo... é um circo de horrores perpetrados pelos que deviam ser a elite cultural do país. E estamos falando de jovens que tiveram o privilégio de serem universitários em meio a analfabetos e semi-alfabetizados. Que fazem parte daqueles que receberam mais, em um país onde a regra é receber menos. A mídia tem divulgado o aumento do número de vagas ocupadas por pessoas mais ricas nos vestibulares de faculdades públicas, mostrando o agravamento da concentração de renda.
A origem do termo tem interessante simbolismo. Classicamente o trote se refere a certa forma de movimentação de cavalos, situada entre o passo e o galope. É processo que deve ser ensinado, muitas vezes por meio de chicote e espora. Lamentavelmente é dessa maneira que o calouro é encarado, em muitas universidades, pelo veterano. A título de “confraternização”, ele deve ser “domesticado” por meio de práticas humilhantes e vexatórias, geralmente estimulado por grandes quantidades de bebidas alcoólicas que é obrigado a ingerir, para que simbolicamente “aprenda a trotar”. Por incrível que pareça ainda existem defensores do trote, que querem dar a ele a função de rito de passagem ou ritual de iniciação, sendo método para promover a lealdade e a camaradagem do grupo por meio do sofrimento compartilhado, o que criaria um vínculo entre calouros e veteranos.
Não é assim que deve começar a formação de um médico. Não é assim que deve um universitário, como cidadão, fazer suas manifestações de agradecimento ao sacrifício de muitos para que poucos cheguem à universidade. Os que aí chegam devem ser exemplos de cidadania e não de violência.
Temos proposto uma campanha nacional pela abolição do trote e substituição por recepção civilizada e social ao novo universitário, que já diferencie aqueles que alguns anos depois vão jurar exercer Medicina ética, com zelo e respeito pelos pacientes e pelos colegas. Pouca gente se preocupa com esta proposta. Continuam vendo, passivamente, futuros médicos embriagados participando, forçados ou não, da celebração das diferenças sociais, já que uma das atividades “clássicas” do trote é pedir moedas em esquinas, ocupando o lugar dos infelizes que, lamentavelmente, vivem dessas esmolas.
Questionadas a respeito algumas diretorias de faculdades tem respondido argumentando que o trote está proibido dentro de seus “campi”. É pouco. É o mesmo que admitir que, depois de formado, o médico possa cometer barbaridades, desde que não seja no hospital, ambulatório ou consultório.
A maioria dos calouros é contra esse tipo de trote, mas acaba sendo suplantada pela minoria que o admite porque espera, com ansiedade, o ano seguinte para a “vingança”.
É fundamental que a categoria médica reconquiste o respeito da população. Não se pode esquecer que o calouro é o futuro médico e o trote selvagem não é maneira correta de se começar o preparo para uma profissão que lida com vida, saúde e ética.